Com método cubano, Sem Terra zeram analfabetismo em seis assentamentos

O projeto de alfabetização na Bahia se utilizou da metodologia das tele aulas em dezessete turmas, cada uma acompanhada por um educador.

12 de maio de 2015

“Zerar o analfabetismo é o primeiro passo para libertar o trabalhador das prisões deste sistema desigual”, afirmou o coletivo de Educação do MST durante a formatura de 180 trabalhadores Sem Terra que participaram do projeto cubano de alfabetização para jovens e adultos, “Sim, eu Posso”. A comemoração aconteceu neste último sábado (9), na Escola Popular de Agroecologia e Agrofloresta Egídio Brunetto, no Assentamento Jaci Rocha, município do Prado – Extremo Sul da Bahia -, e reuniu mais de 300 famílias.O projeto de alfabetização conseguiu zerar o analfabetismo nos Assentamentos Jaci Rocha, Antônio Araujo, Bela Manhã, Herdeiros da Terra, José Martí e Abril Vermelho, usando como metodologia tele aulas em dezessete turmas, cada uma acompanhada por um educador.

Além disso, quatro coordenadores pedagógicos estavam cumprindo o papel de organizar e construir coletivamente com os educandos e educadores temas norteadores para os debates em sala de aula. Com o lema “Sim, eu posso ler e escrever. Essa é uma conquista do MST”, as aulas tiveram início no dia 10 de janeiro e foram finalizadas no dia 25 de abril deste ano.

 Dificuldades

Ao longo do processo algumas dificuldades surgiram, especialmente porque a maioria dos educandos estão em idade avançada e trabalham todos os dias na produção familiar. Devido ao cansaço, muitas faltas aconteciam. Em muitos assentamentos as salas de aula não tinham estrutura para o desenvolvimento do projeto. Para superar essa dificuldade, foi preciso a participação e cooperação de todos educandos, educadores e da comunidade. Outra dificuldade surgiu nos primeiros dias de aula. Compreender a metodologia abordada pelo projeto, com as tele aulas e associar as letras e números ao processo de alfabetização não foi fácil.Segundo os educadores, esta dificuldade se dá por conta do processo de alfabetização já construído pelo modelo de educação do Estado, que mecaniza a metodologia.

De acordo com Eliane Kay, coordenadora do projeto, o programa alcançou bons resultados apesar das dificuldades enfrentadas. “Contamos com ferramentas muito importantes para

Sim, eu Posso

O projeto de alfabetização “Sim, eu Posso” foi construído em Cuba pela pedagoga Leonela Relyz Diaz, falecida em janeiro deste ano. As atividades desenvolvidas propõem alfabetizar em apenas três meses, utilizando-se da linguagem popular e dos números como referência educativa. Além disso, são escolhidos temas geradores que dialogam com a realidade de cada localidade, para garantir um espaço de debate e formação política.

“O mais importante deste projeto é que a abordagem parte da comunidade para os educandos. Desta forma, cada estudante acaba se sentindo mais seguro para avançar nos debates e compreender o mundo de uma forma diferente”, afirma o educador Lindoel. O ‘Sim, eu Posso’ já contribuiu para erradicação do analfabetismo em diversos países, como Vietnã, Bolívia e Venezuela.

Educandos

Durante a formatura muitas histórias de vida emocionaram a todos. A assentada Maria Aparecida declarou que não tinha pai, e sua mãe era pobre. “Me criei na roça trabalhando, e então não tive como estudar. Quando ainda era criança minha mãe falava que estávamos indo a aula para arrumar namorado, e ai ela não deixava a gente estudar”, recorda. A história de José Sebastião não é diferente. “Eu não fui à escola quando era criança, porque meu pai colocava a gente nos trabalhos da roça. E não foi só eu, meus dois irmãos passaram pelo mesmo”.

Já sabendo ler e escrever, Sebastião afirma que hoje as coisas mudaram. “Consigo ler algumas palavras, inclusive as cartas e bilhetes que meus filhos mandam para mim. Consigo também escrever meu nome. Me sinto livre. Sempre precisei de alguém para fazer essas coisas. Hoje não”.

Formatura

Ao parabenizar a todos os educandos pela coragem e o desafio de concluir os estudos, Eliane Kai, da direção regional do MST, disse que “este é um momento sublime, de alegria e festividade, porque o objetivo foi alcançado. Conseguimos zerar o analfabetismo em seis áreas destinadas a Reforma Agrária, e a partir de agora essas áreas são territórios livres”. Já Evanildo Costa, da direção estadual do MST, afirmou que “essa é uma experiência muito importante. É um projeto que deu certo e que as autoridades políticas da região deveriam tomá-lo como exemplo na luta contra o analfabetismo e desenvolvimento da nossa região”.

O Deputado Federal Valmir Assunção (PT – BA) parabenizou o exemplo de força e resistência dos educandos em superar as dificuldades e abrirem novos horizontes. Para Assunção, o resultado desse projeto deve ser levado ao conhecimento da sociedade. “Defenderei junto ao governador da Bahia, Rui Costa, a importância da multiplicação desse projeto para eliminação do analfabetismo em nosso estado”, concluiu.

Entrevista com João Dagoberto: Transgénicos: enquanto o mundo recusa, o Brasil aprova

“Quando a empresa fala que só irá plantar uma pequena porcentagem de 2% a 3% de eucalipto transgênico, nós estamos falando de 20 a 30 mil hectares”, adverte o engenheiro florestal.

A aprovação do plantio de eucalipto transgênico, decidida no mês passado em audiência na CTNBio, teve uma repercussão internacional que pode ser contabilizada em mais de 100 mil assinaturas contrárias à aprovação, informaJoão Dagoberto dos Santos, em entrevista à IHU On-Line. Como reação às manifestações, afirma, o Ministério das Relações Exteriores votou contra a aprovação do eucalipto transgênico, enquanto o “Ministério do Meio Ambiente – MMA não esteve presente e não votou”.

 Na avaliação do engenheiro florestal, os experimentos realizados para a aprovação do eucalipto transgênico foram “insuficientes, porque seguiram o procedimento de espécie de ciclo curto”, como a soja e o milho, e porque “em campo não ofereceram subsídios para as conclusões de que os eucaliptos não irão gerar impactos”.

 

Na entrevista a seguir, concedida por telefone, Santos explica que entre os possíveis impactos da produção de eucalipto transgênico, avalia-se a contaminação do mel ocasionada pelo pólen e o alto consumo de água. “O eucalipto transgênico não vai ter esse rendimento de 20% que estão prevendo, mas, supondo-se que terá este rendimento, irá criar um impacto gigantesco, tanto no consumo de água quanto no uso de insumos aloquímicos, porque vai se cortar o ciclo na época em que a floresta plantada está chegando no nível de estabilidade, momento em que pode controlar um pouco a quantidade de agrotóxicos que é utilizada”, pontua.

 

Segundo ele, nos últimos anos tem aumentado o número de pesquisas que analisam as consequências ambientaisdo uso combinado de agrotóxicos e transgênicos na agricultura. Por conta disso, “as empresas juntaram seus pesquisadores para acelerar alguns processos para poder ganhar tempo e aprovar a maior parte de processos e projetos possíveis”. No Brasil, frisa, “empresas estão querendo mudar as regras da CTNBio para agilizar os processos; argumentam que o processo atual de avaliação da liberação dos transgênicos toma muito tempo e, por isso, estão propondo a criação de comitês ad hoc externos para acelerar os processos de aprovação”.

 

João Dagoberto dos Santos é doutor em Recursos Florestais pela Universidade de São Paulo – USP e atualmente leciona na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo – Esalq/USP.

 

Confira a entrevista.

 

Foto: noticias.terra.com.br

IHU On-Line – Como foi o processo de negociação do eucalipto transgênico até a sua aprovação, no mês passado, na CTNBio?

 

João Dagoberto dos Santos – O que havia anteriormente dentro do escopo da CTNBio era uma proposta de outra empresa para a diminuição e mudança do teor de lignina do eucalipto. Essa proposta foi bloqueada pela CTNBio, mas aí a empresa transformou o projeto, argumentando que o eucalipto transgênicoaumentaria a velocidade de crescimento dessa cultura.

 

Os argumentos dos membros da CTNBio que foram contrários à aprovação foram os mesmos de sempre, de que havia uma imprecisão no processo tecnológico da construção da genética do eucalipto em si. Argumentou-se também que o eucalipto transgênico traria um problema muito sério para silvicultura, porque os eucaliptos seriam árvores para produção de papel e isso afetaria toda a cadeia produtiva. As empresas perceberam que era um processo que não iria “colar”, então deram uma “amenizada” no processo e começaram a rever a lógica da tecnologia.

 

IHU On-Line – Como os membro da CTNBio reagiram ao argumento de que o eucalipto transgênico seria mais produtivo do que os demais, e isso permitiria reduzir a necessidade de área, liberando espaço para a produção de alimentos?

 

João Dagoberto dos Santos – A CTNBio não lida com essa questão. A não ser nós, pesquisadores, que levantamos questões referentes aos possíveis impactos, os demais membros da CTNBio dizem que não é papel deles tratar dospossíveis impactos, porque o que importa é a segurança da tecnologia. Se a tecnologia proposta estiver dentro das regras que foram estabelecidas, os membros da CTNBio dizem claramente que as demais implicações possíveis em relação a um organismo transgênico não é problema deles, e sim um problema do Ministério do Meio Ambiente – MMA e de outras instituições. Desse modo, isentam-se irresponsavelmente.

 

Na questão do eucalipto, o problema é que os procedimentos e os protocolos utilizados foram os mesmos usados para organismos de ciclo curto. Então, o mesmo protocolo que se usou para a aprovação da soja e do milho, como os indicadores biológicos, foram usados para a aprovação do eucalipto transgênico. Ocorre que esses indicadores utilizados são insuficientes e inadequados. A empresa contra-argumenta dizendo que sente muito, mas que não tem como voltar atrás, porque dedicaram anos de pesquisa na elaboração do eucalipto transgênico.

 

IHU On-Line – A discussão sobre a aprovação de um organismo transgênico é feita em outra instância, além da CTNBio?

 

João Dagoberto dos Santos – A aprovação de um organismo transgênico não existe em nenhuma instância superior à CTNBio. A única possibilidade de barrar a aprovação de um organismo transgênico, depois de aprovado pelaCTNBio, é através da convocação do Conselho de Ministros — que está previsto no regulamento da CTNBio — e é a única instância que pode revogar essa decisão, mas isso nunca aconteceu. Como essa é uma política de Estado, o Estado assume que não vai rever e que não vai rediscutir a aprovação de um organismo transgênico, porque terá que admitir as falhas, e as falhas são inúmeras. Tudo que nós prevíamos — e está tudo registrado — como grupo crítico contra os procedimentos, e não contra a tecnologia, está se comprovando: aumentou a resistência dos organismos geneticamente modificados aos herbicidas e aos insetos, portanto a tecnologia não está funcionando; a produtividade também não é maior nos organismos transgênicos. A CTNBio atribui essas responsabilidades à empresa, mas isso é um absurdo, porque a empresa é responsável por fazer os estudos e ela mesma é responsável por monitorar as culturas transgênicas; trata-se de algo surreal.

 

O Estado assina embaixo; é parceiro e sócio das empresas na prática porque as próprias empresas fazem e monitoram todo o processo de desenvolvimento de um produto transgênico. Se precisar identificar uma falha, as empresas é que deverão fazer isso, mas elas não vão fazer isso nunca, como não estão fazendo. A única exceção é a própria Embrapa, que declarou que forçou um processo por uma contingência política, referindo-se ao feijão transgênico. Depois da aprovação do feijão, a Embrapa verificou que ele tem problemas, e não está liberando essa cultura transgênica, porque está admitindo que o que prevíamos à época da aprovação, em 2011, está acontecendo.

 

IHU On-Line – Como se dá a fiscalização dos impactos e das implicações dos cultivos transgênicos?

 

João Dagoberto dos Santos – O MMA é o responsável legal, ou deveria ser, mas se omite e nem participa das reuniões referentes ao tema. O MMA tem um assento dentro da CTNBio, mas nas últimas duas reuniões nem se fez presente. O responsável legal, que pode ser ele ou o Ministério Público, se omite e não se manifesta sobre a aprovação de transgênicos.

"Os 18 votos a favor representam sempre o quórum que é maioria absoluta"

 

IHU On-Line – Como as discussões são feitas antes de uma proposta transgênica ser apresentada à CTNBio? São feitas apresentações ao MMA?

 

João Dagoberto dos Santos – Não existem apresentações ou debates prévios, porque todos os processos são conduzidos comosegredo industrial, com causas de confidencialidade. Quando os projetos são submetidos à CTNBio, os membros têm que assinar um termo de confidencialidade, segundo o qual não podem emitir informações sobre o assunto e tampouco informar que um novo organismo está sendo usado para criar um novo evento, seja lá qual for. Só os membros da CTNBio têm acesso a essas informações, mas eles nem aparecem nos processos, porque trata-se de segredos industriais. É uma situação muito orquestrada politicamente.

 

Aldo Rebelo, quando era deputado, fez uma coalizão e consultou a cúpula do governo para saber a posição sobre os transgênicos. No mês passado, antes da aprovação do eucalipto transgênico, Rebelo se reuniu com os membros daCTNBio e com a cúpula do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação – MCTI, e declarou publicamente: “pesquisadores e cientistas que têm algum tipo de relação com movimentos sociais e ONGs são ignorantes e obscurantistas, portanto não é possível que pesquisadores sejam contra esta tecnologia”. Então, estamos em uma situação complicada, na qual a CTNBio e parte do governo estão capituladas.

 

Quem votou contra a aprovação do eucalipto transgênico foi o Ministério das Relações Exteriores, porque está vendo a repercussão desse caso no mundo inteiro: chegaram quase 100 mil assinaturas de instituições, indivíduos, embaixadas do mundo inteiro repudiando a aprovação. O Ministério do Meio Ambiente – MMA não esteve presente e não votou, e os outros representantes da agricultura familiar foram contra. Os 13 representantes do MCTI sempre votam a favor, nunca votam contra nada, votam em bloco, fazem pareceres de forma homogênea. Parece uma receita de bolo: eles olham, avaliam, seguem um script, e nunca perderam uma votação.

 

IHU On-Line – Considerando o alto número de votos favoráveis à aprovação do eucalipto transgênico, a declaração do Ministro Aldo Rebelo no dia anterior à votação influenciou na decisão de voto de alguns membros da CTNBio?

 

João Dagoberto dos Santos – Não, porque o número de votos aprovando organismos transgênicos é sempre alto. Onúmero de votos favoráveis ao eucalipto transgênico só não foi mais alto porque alguns membros não estavam presentes. Os 18 votos a favor representam sempre o quórum que é maioria absoluta. Então, o Aldo não intimidou, ao contrário, fortaleceu os votos a favor e garantiu a segurança. A votação foi fechada, embora geralmente seja audiência aberta, mas nesse caso criou-se um esquema de segurança, porque os membros da CTNBio disseram que se sentiam inseguros e ameaçados com os eventos da ocupação do MST e da pressão popular. Não é a primeira vez que isso ocorre; outras vezes em que os membros da CTNBio se sentiram pressionados, outros ministros se sentiram obrigados a admitir e assumir publicamente a defesa da CTNBio, porque eles são coautores da atual engenharia que se criou para fazer esse processo.

 

IHU On-Line – Quais argumentos importantes foram desconsiderados pela CTNBio na ocasião do eucalipto transgênico? Que aspectos deveriam ser considerados antes da sua aprovação?

 

João Dagoberto dos Santos – Um dos argumentos foi o de que o eucalipto seguiu o mesmo protocolo de outras espécies, o que é um absurdo, porque ele é uma árvore. O outro argumento é de que os experimentos realizados são insuficientes, primeiro porque seguiram o procedimento de espécie de ciclo curto; segundo, porque os experimentos foram descaracterizados por vários motivos, e experimentos em campo não ofereceram subsídios para as conclusões de que os eucaliptos não vão gerar impactos. O tempo de experimentação é insuficiente, porque nós estamos falando de uma árvore de ciclo longo, perene, e as empresas estão considerando ciclos curtos. Os testes feitos com relação aos derivados, seja do eucalipto em si, seja do seu impacto ou das externalidades, que nós chamamos da relação do pólen e da contaminação, foram insuficientes e não conclusivos. Contudo, o argumento da empresa é de que isso não é importante, que eles vão plantar eucalipto transgênico, monitorar as plantações e, se houver algum impacto, irão reverter a situação.

 

Só que eucalipto não é soja e milho, que têm ciclo curto e que você pode passar um trator em cima e destruir a plantação. O setor florestal e a empresa — no caso, a proponente — têm mais de um milhão de hectares plantados no Brasil. Quando a empresa fala que só irá plantar uma pequena porcentagem de 2% a 3% de eucalipto transgênico, nós estamos falando de 20 a 30 mil hectares. Eles nem calcularam nem dimensionaram o impacto, porque fizeram o experimento em um hectare. Avaliaram um ciclo de polinização apenas, onde as colmeias entraram em colapso. Ou seja, todos os indicadores que podiam dar segurança à sociedade não foram respeitados, foram negligenciados ou feitos de forma artificial. Os próprios experimentos e as pessoas que eles contrataram, que têm relação com a empresa, admitiram que houve cortes de recursos, que não houve tempo de realizar as pesquisas e que o ideal seria prorrogar a decisão.

 

Entre as questões que para nós são significativas, uma delas é a do mel — da contaminação que o pólen pode ocasionar — e também a do consumo de água. O eucalipto transgênico não vai ter esse rendimento de 20% que estão prevendo, mas, supondo-se que terá este rendimento, irá criar um impacto gigantesco tanto no consumo de água quanto no uso de insumos aloquímicos, porque vai se cortar o ciclo na época em que a floresta plantada está chegando no nível de estabilidade, momento em que pode controlar um pouco a quantidade de agrotóxicos que é utilizada.

 

Além disso, todos os estudos admitem que o ganho sugerido pelo eucalipto transgênico não é real e não está comprovado. Além disso, os métodos atuais de melhoramento tradicional, de multiclones ou mesmo melhorias nas empresas, dentro da fábrica, no processo industrial, dão um ganho tão grande ou maior do que este que está sendo prometido.

"Como essa é uma política de Estado, o Estado assume que não vai rever e que não vai rediscutir a aprovação de um organismo transgênico, porque terá que admitir as falhas, e as falhas são inúmeras"

 

IHU On-Line – Como a lei de biossegurança é interpretada em casos de aprovação de transgênicos?

 

João Dagoberto dos Santos – As empresas seguem a lei de biossegurança, portanto, se isentam dizendo que só tratam da questão da biossegurança, ou seja, se a tecnologia está dentro dos parâmetros considerados aceitáveis. Então, as empresas usam as brechas da lei para tirar de si essa obrigação de avaliar os impactos dos transgênicos com profundidade. É uma lei “legal e imoral”, porque ela tem mecanismos que dão segurança às empresas no sentido de que as dúvidas e incertezas não atrapalhem os processos de aprovação dos transgênicos. Ou seja, as próprias empresas contribuíram para a construção da lei, e se acobertaram e se blindaram de uma forma muito eficiente. Dessa forma, quando há algum problema, é acionada a consultoria jurídica do Ministério, porque a CTNBio é um órgão do governo a serviço de uma pretensa evolução tecnológica do país, a serviço de empresas que só têm objetivo de lucro.

 

IHU On-Line – É possível estimar em que regiões do país serão plantados os eucaliptos transgênicos?

 

João Dagoberto dos Santos – Sim, porque a dona da tecnologia, a Suzano, via FuturaGene, que é a empresa de tecnologia, tem áreas plantadas em São Paulo, na Bahia, em Minas Gerais e, mais recentemente, no Piauí e noMaranhão. Eles irão plantar nas áreas deles. Os argumentos absurdos que usam é de que os primeiros clientes aos quais irão oferecer as mudas transgênicas são os agricultores familiares e fomentados, que são os mais possivelmente impactados pela contaminação do pólen.

 

Nós que somos contra o eucalipto transgênico — engenheiros florestais, professores de universidades, instituições —, não somos contra a tecnologia, porque seria um sonho ter um evento desse nível que realmente trouxesse o que se está prometendo, mas não é essa a questão, os plantios de eucalipto estão seguindo a mesma rota das culturas dos monocultivos agrícolas, estão sofrendo um sério ataque de pragas e doenças.

 

IHU On-Line – Qual a situação de outras culturas transgênicas já cultivadas?

 

João Dagoberto dos Santos – Os casos que chamam muito a atenção são o milho e a soja, que são nossos principais carros-chefes. Uma praga em algumas áreas de zona de plantio de soja, atualmente, é o milho, que está resistente ao processo e está se reproduzindo espontaneamente no meio das plantações de soja. Então, o milho está com vários problemas, porque inclusive a produção não está aumentando. Em relação à soja, a produtividade estacionou, cada vez mais existem ervas daninhas resistentes aos herbicidas, tanto que aprovaram o 2,4-D, porque todo o pacote anterior do Roundup se mostrou insuficiente.

 

Vários dados começam a aparecer em pesquisas no mundo inteiro, as quais estão mostrando os resultados dessepacote de transgênico com agrotóxico. As empresas perceberam isso e juntaram seus pesquisadores para acelerar alguns processos para poder ganhar tempo e aprovar a maior parte de processos e projetos possíveis. As empresas estão querendo mudar as regras da CTNBio para agilizar os processos; argumentam que o processo atual de avaliação da liberação dos transgênicos toma muito tempo e, por isso, estão propondo a criação de comitês ad hoc externos para acelerar os processos de aprovação. Mas se hoje os processos já são ruins, imagina com processos acelerados. O governo está totalmente à mercê da pressão das indústrias.

"Todos os estudos admitem que o ganho sugerido pelo eucalipto transgênico não é real e não está comprovado"

 

IHU On-Line – Qual a receptividade dessas culturas transgênicas exportadas no exterior?

 

João Dagoberto dos Santos – O mundo inteiro está resistindo. Hoje o maior crescimento de produção nos Estados Unidos é a produção de não transgênicos de soja, por exemplo. A produção que mais cresce nos Estados Unidos é a produção de não transgênicos. O problema é que as empresas têm um lobby muito forte; é só ver o lobby que a Monsanto acabou de fazer nessas últimas duas semanas na comissão europeia. Agora as empresas estão querendo romper barreiras, e a sociedade nunca resistiu tanto — se fizermos um levantamento, nunca houve tanta informação e tanta resistência. O que eles estão fazendo? O modelo do agronegócio está indo para a África e parte da Ásia, onde não há resistência, ao contrário, os governos são frágeis, as instituições democráticas, quando existem, são muito frágeis. A nova fronteira é a África, onde o agronegócio está chegando com um pacote deletério. Tudo que tem de ruim não aprovado e não liberado no resto do mundo está indo para lá.

 

Um dos argumentos utilizados para garantir a expansão dos transgênicos para outros países foi o de que aEmbrapa, que é uma empresa pública, aprovou o feijão transgênico, que é um alimento da segurança alimentar dos brasileiros. Essa foi a propaganda que varreu a África. A Embrapa se deixou utilizar em uma propaganda desse nível para falar que a tecnologia é boa a ponto de que a maior empresa do mundo tropical — que é a Embrapa — desenvolveu um feijão que faz parte da base alimentar do brasileiro.

 

IHU On-Line – Que outras culturas estão na pauta de aprovação da CTNBio?

 

João Dagoberto dos Santos – Os maiores pedidos de aprovação são em relação ao milho, mas tem uma coisa que preocupa muito, que é a tentativa de aprovar o milheto transgênico. A previsão é de que se tente aprovar a cana-de-açúcar, com a mesma lógica de piramidados, ou seja, das tecnologias associadas onde os impactos são gigantescos principalmente por causa da instabilidade genética. O 2,4-D é o exemplo mais claro do absurdo, porque estão revendo uma molécula que tem uma lógica baseada no agente laranja em substituição ao Roundup, que teve sua patente caída e que já não funciona mais para maior parte das culturas do pacote tecnológico dos transgênicos.Quando foi interrompida a votação do eucalipto, dois minutos antes foi aprovado o 2,4-D, o que no nosso entendimento é tão pior ou mais grave do que a aprovação do eucalipto.

 

Se você perceber, tudo isso está casado com a aprovação na Câmara da retirada da identificação “T” das embalagens dos produtos transgênicos. As empresas são muito eficientes e estão agindo em todas as frentes: na frente da comunicação, na frente parlamentar e política, na frente da cooptação.

 

Quando se teve a grande resistência à soja transgênica, principalmente a Monsanto achou que não haveria resistência no Brasil, como não está tendo na África. Então eles avaliaram historicamente que foi um erro de estratégia achar que não haveria resistência, e agora estão tentando recuperar o tempo perdido. O pessoal da tecnologia do eucalipto disse o seguinte para os membros da CTNBio: “fiquem tranquilos, nós não somos aMonsanto, nós não estamos cometendo o mesmo tipo de erro que a Monsanto, nós estamos tentando fazer 'direitinho’”. Essas empresas têm um time hegemônico de assessores e consultores, mas nós que somos contra não temos essa equipe; temos que ler todos os processos e tentar fazer pareceres para deixar um registro histórico para que a sociedade tenha onde se referendar, pois, do contrário, nem isso aconteceria, porque vamos para as audiências da CTNBio sabendo que não ganharemos nenhuma votação.

Entrevista de Gilmar Mauro, sobre a conjuntura politica, mst, governo,

‘Governo paga o preço pela ação despolitizadora do último período’                   

QUARTA, 06 DE MAIO DE 2015

Em tempos de crises agudas e agressão aos direitos dos trabalhadores, conversamos com  Gilmar Mauro, importante liderança do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Decepcionado com algumas prioridades do governo federal, Gilmar lamentou a indicação de Kátia Abreu para o Ministério da Agricultura e o pouco avanço que a pauta da reforma agrária obteve nos últimos períodos. Para ele, o governo paga, agora, o preço da despolitização gerada pelos anos triunfais do lulismo.

     
 
 

 

 

Em tempos de crises agudas e agressão aos direitos dos trabalhadores, conversamos com  Gilmar Mauro, importante liderança do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Decepcionado com algumas prioridades do governo federal, Gilmar lamentou a indicação de Kátia Abreu para o Ministério da Agricultura e o pouco avanço que a pauta da reforma agrária obteve nos últimos períodos. Para ele, o governo paga, agora, o preço da despolitização gerada pelos anos triunfais do lulismo.

 

 “A indicação da Kátia Abreu para nós foi uma surpresa no sentido negativo. Não imaginávamos que uma representante de um setor que sempre nos combateu, combateu a agricultura familiar e os sem terra nesse país pudesse ter assento como ministra do governo que nós ajudamos a eleger”.

 

 Apesar de reiterar a necessidade da sonhada reforma agrária, Gilmar afirmou que tal debate, hoje, virou uma responsabilidade de toda a sociedade, pois o atual modelo agrário envolve o abastecimento de água, de energia, a alimentação, o desmatamento e a poluição do solo.

 

“A reforma agrária hoje em dia não depende só dos sem terra, do MST e dos movimentos de luta por ela, mas de um debate amplo da sociedade. Não cabe mais uma reforma agrária no estilo clássico no Brasil, nós temos de discutir com a sociedade que tipo de uso vamos dar ao solo, à água e aos recursos naturais”, destacou.

 

Por fim, Gilmar Mauro reafirmou a necessidade da criação de novos instrumentos de luta de classe, “mais horizontais” e que abarquem uma parcela maior da classe trabalhadora, inclusive no sentido de se formar uma ampla frente de representações progressistas. Um desafio não só brasileiro, mas de escala planetária.

 

Correio da Cidadania: Como você, como uma das vozes e líderes de um dos maiores movimentos sociais do Brasil, tem visto o atual governo, imerso em uma crise política e de representatividade, além de condutor de uma política econômica contrária às promessas de campanha, que deve ter forte impacto contracionista, além de induzir grave crise social?

 

Gilmar Mauro: De fato, é uma situação que nós todos não esperávamos, de o governo acenar com um discurso na campanha e, ao adentrar a presidência, propor um ajuste fiscal que todos sabemos não ter feito nenhum país do mundo crescer. Principalmente quando esse ajuste recai sobre os trabalhadores.

 

Mas eu acho que tanto no mandato anterior quanto nesse, e de certa forma também um pouco nos tempos de Lula, o governo despolitizou de maneira geral a sociedade. Essa história, por exemplo, de construir o linguajar de classe média é completamente despolitizadora e agora o governo está colhendo os frutos disso. Eu digo que é despolitizador porque essa ideia de classes A, B, C, D e E, ou seja, essa sopa de letras, é oriunda da sociologia norte-americana, que discute a possibilidade de mobilidade social sem a alteração da estrutura de propriedade, que no caso brasileiro não foi alterada no último período. Na análise marxista, tem-se a ideia de quem é proprietário dos meios de produção e de quem não é proprietário e vende sua força de trabalho. Portanto, em detrimento da propriedade e da venda da força de trabalho, o consumo define uma ou outra classe. É um processo despolitizador e que instigou a ideia do consumo.

 

Evidentemente, durante o governo Lula houve crescimento econômico.  É importante destacar que o governo Lula foi beneficiado por um cenário internacional favorável às commodities agrícolas, os preços subiram e, aproveitando-se disso e com os investimentos e financiamentos públicos, somados à abertura de capital com algum ganho salarial, emprego etc., produziu-se um crescimento econômico tímido, mas com alguns ganhos. Construiu-se a ideia de que é possível que todos ganhem: capitalistas e trabalhadores, e todos nós sabemos que isso não é possível no capitalismo. Podemos ter situações favoráveis, como as que aconteceram principalmente no segundo mandato do Lula, mas esse cenário foi se modificando ao longo do governo Dilma e, evidentemente, não dá para todo mundo ganhar no capitalismo.

 

A segunda questão, que no meu modo de ver foi um erro, é a ideia de trabalhar na dimensão despolitizadora de classe média. Porque, na verdade, o que nós temos é um contingente muito grande de classe trabalhadora, com composição muito heterogênea. Com setores extremamente precarizados, a grande maioria, e uma parte inserida no mercado. Mas, no final das contas, é tudo classe trabalhadora.

 

O cenário macroeconômico mundial e brasileiro, com o ingrediente da despolitização, trouxe para esse mandato de Dilma vários problemas. O primeiro deles é que não dá para seguir a lógica do governo Lula porque o cenário internacional é outro. E o governo não tem mais dinheiro, porque, nesses mandatos, não foram feitas reformas profundas, sem desconsiderar algumas melhorias no social que tivemos. Mas não houve reforma agrária, não houve reforma nos meios de comunicação, não houve reforma política, não houve reforma no poder judiciário e, portanto, os grandes temas brasileiros continuam tais quais foram legados pelos governos anteriores. É a situação de agora da economia internacional em crise, com um cenário difícil e sem dinheiro. E aí vem o ajuste, que implica cortes de gastos sociais e perdas para a classe trabalhadora.

 

No meu modo de ver, é um governo que, do ponto de vista ideológico, diz uma coisa e faz exatamente outra, mas também paga um preço pelo processo de despolitização vivido no último período.

 

Vou dar mais um exemplo. Todos nós sabemos que quem produz a nossa riqueza é a classe trabalhadora. Uma ponte ou uma escola é produzida por operários da construção civil, por engenheiros, por arquitetos, ou seja, governo nenhum produz a ponte ou constrói a escola. E quem paga a conta também é a classe trabalhadora, porque uma parte da mais-valia é extraída e utilizada no pagamento dos impostos que sustentam o Estado. Governo nenhum faz grandes coisas, mas um bom governo estabelece boas prioridades e isso nunca foi feito no Brasil.

 

Tem mais um ingrediente importante de destacar: estamos vivendo uma época, em escala planetária, de falta de projeto político. A minha impressão – e vários intelectuais compartilham dessa impressão – é de que não há futuro, apenas presente, e o presente significa consumo. Quando eu falei da despolitização e de instigar o consumo, estamos vivendo isso em escala planetária. As juventudes e adolescências desse tempo histórico estão muito ligadas ao tempo presente e ao consumo, e o tal do consumo é uma coisa efêmera. A pessoa consome hoje, amanhã não consegue consumir outro produto, entra em depressão e assim por diante. Mas o pior não é isso. Em tempos passados, a juventude queria se igualar ou ser parecida com os pais. Agora vivemos um tempo invertido: os pais estão querendo ser iguais aos filhos, é a busca da juventude eterna.

 

A minha impressão é que falta um projeto para o futuro e digo isso principalmente por conta do ingrediente da despolitização. Governos que contribuem com tal processo, evidentemente, produzem situações como a que estamos vivendo. Além dos problemas da falta de enfrentamento às questões centrais do Brasil, estamos vivendo um tempo em que o neoliberalismo, em escala planetária, está muito eficiente do ponto de vista ideológico. Foi um fracasso do ponto de vista econômico e social, mas, ideologicamente, um sucesso. E ao mesmo tempo, há uma dificuldade muito grande das esquerdas, dos movimentos e dos instrumentos organizativos da classe trabalhadora de fazer um diálogo amplo com as massas.

 

Correio da Cidadania: Qual é a postura do MST face ao governo diante da atual conjuntura? Tem havido alguma revisão da relação do movimento com o governo Dilma?

 

Gilmar Mauro: Nesse momento conjuntural, e em outros, continuamos colocando a pauta da reforma agrária. Nós achamos que o primeiro mandato do governo Dilma foi um desastre para a reforma agrária, não avançamos em praticamente nada no governo anterior e a pauta continua estagnada. Toda a lógica macroeconômica, baseada na produção de commodities agrícolas para ter um equilíbrio no balanço de pagamentos, foi estimulada desde o governo FHC, passou por Lula e chegou a Dilma. Ou seja, buscava-se, através da exportação de commodities e da busca por superávit comercial, equilibrar o balanço de pagamentos, negativo nas contas e serviços. E tudo isso levou a uma priorização e grandes investimentos no agronegócio.

 

Evidentemente, o agronegócio se beneficiou desde o governo FHC, passando por Lula e Dilma, muito mais do que a agricultura familiar e muito mais do que os movimentos sociais e populares, como o Movimento dos Sem Terra. A reforma agrária ficou estagnada. O que nós estamos trabalhando no momento? Estamos colocando a pauta da reforma agrária em debate e estamos atentos para que não haja nenhum tipo de retrocesso do ponto de vista da luta democrática. Não sou lá um defensor desse Estado Democrático de Direito, que é um Estado de classes e nunca orientado a servir aos interesses da classe trabalhadora, entretanto, sou contrário a retrocessos, golpismos etc.

 

O que estamos tentando colocar agora, junto com outras organizações sociais, é uma pauta da classe trabalhadora, que se contraponha tanto à agenda do governo, de ajuste econômico, quanto ao Congresso, através da aprovação do PL 4330 (das terceirizações de atividades-fim) e de outras medidas que, no nosso modo de ver, são afrontas às conquistas da classe trabalhadora, assim como é uma afronta o projeto de lei sobre a redução da maioridade penal.

 

Ou seja, estamos nos colocando contra isso tudo e ao mesmo tempo tentando construir uma pauta política que coloque os temas da classe trabalhadora em evidência e em discussão. Isso está se fazendo com lutas. Só nesse mês de abril, nós conseguimos fazer mais de 30 ocupações, chegando perto de 50 ocupações de terra pelo Brasil, número que só tende a crescer. E, ao mesmo tempo, estamos participando de todas as jornadas de lutas unificadas pelos setores da classe trabalhadora contra as medidas recessivas do governo, do congresso e do poder judiciário.

 

Correio da Cidadania: Como o movimento recebeu a nomeação de Kátia Abreu para o Ministério da Agricultura? Qual o significado dessa nomeação e qual o impacto que poderá ter na continuidade de um processo de reforma agrária, antiga promessa do Partido dos Trabalhadores?

 

Gilmar Mauro: Como contraponto à indicação da Kátia Abreu, foi indicado um bom ministro do Desenvolvimento Agrário, que é o Patrus Ananias. Inclusive, contrapondo pessoalmente grande parte dos postulados defendidos pela Kátia Abreu. Qual é o problema? É que o Ministério do Desenvolvimento Agrário tem um orçamento pífio, inclusive com a perspectiva de contingência de 40% do orçamento para a reforma agrária.

 

A indicação da Kátia Abreu para nós foi uma surpresa negativa. Não imaginávamos que uma representante de um setor que sempre nos combateu, sempre combateu a agricultura familiar e os sem terra, pudesse ter assento como ministra do governo que nós ajudamos a eleger. Do ponto de vista simbólico, foi um ingrediente extremamente negativo, entretanto, nós achamos que não devemos entrar nessa briga de nomes, porque o problema não está só nos nomes. O problema é a linha geral do governo, que continua sendo a mesma, de tentar priorizar o agronegócio e o viés da exportação de commodities agrícolas, mesmo com o cenário internacional completamente diferente daquele enfrentado no passado.

 

Evidentemente, isso vai ter consequências, aliás, já está trazendo consequências graves para o nosso país, como o envenenamento do solo e da água, a eterna monocultura, problemas graves com o abastecimento de água, como, por exemplo, no estado de São Paulo. E todo mundo sabe que não é um problema só deste momento. Já é um impacto de consequências, tanto pelo desmatamento quanto pela monocultura, e assim por diante. É uma lógica destruidora do meio ambiente e concentra riqueza e renda no campo. Obviamente, estamos combatendo-a abertamente, não só na indicação e no nome propriamente, porque não adiantaria colocar um outro nome ali que seguisse a mesma lógica. O que buscamos é combater toda essa lógica econômica. É importante, e tenho destacado entre entrevistas no próprio Correio da Cidadania, que a reforma agrária, hoje em dia, não dependa só dos sem terra, do MST e dos movimentos de luta pela reforma agrária, mas de um debate amplo da sociedade.

 

Não cabe mais uma reforma agrária no estilo clássico no Brasil. Nós temos que discutir com a sociedade que tipo de uso vamos dar ao solo, à água e aos recursos naturais. Se for esse uso atual, não precisa mais de reforma agrária. Mas precisamos pensar em novas formas de nos prevenir dos impactos à saúde humana e ambiental desse tipo de modelo. Outra coisa que precisamos discutir é que tipo de comida a humanidade vai querer comer.

 

Assim, nós acreditamos muito que a reforma agrária é necessária. Mas para fazer reforma agrária é preciso discutir o modelo agrícola e esse modelo agrícola aplicado pelo governo Dilma, com a indicação da Kátia Abreu a ministra, é completamente ultrapassado e vai na contramão de uma perspectiva de preservação ambiental com justiça social.

 

Correio da Cidadania: E qual tem sido a postura do governo Dilma com o movimento nesse cenário atual, à luz de toda a relação que desenvolveram desde o primeiro mandato?

 

Gilmar Mauro: Do ponto de vista das reuniões, houve o compromisso recente de fazer o assentamento de todas as famílias acampadas que temos pelo Brasil, que ultrapassam as 120 mil. O indicativo seria que nesse ano o governo não teria condições de assentar muitas famílias, mas que, a partir do ano que vem, e até o término do mandato, conseguiria assentar todas as 120 mil famílias. Eu diria que não é tudo o que nós queremos, evidentemente, mas já seria um bom indicativo. A dúvida é se isso realmente vai ocorrer.

 

Nós sabemos que a luta política não depende só de boa vontade, sabemos que de boa vontade o inferno está cheio e cabe a nós a tarefa de continuar fomentando o debate e nos mobilizando. Acho que há uma tendência nesse próximo período de aumentar o número de lutas e de ocupações de terra por todo o Brasil, pois vivemos um outro fenômeno: o desemprego. No interior e na indústria, o momento é de crise e falência de muitas empresas, com muitos trabalhadores colocados nas ruas. Nossos primos mais próximos, em um momento de crescimento do mercado de trabalho, encontravam alternativas na agricultura ou na cidade, o que até fez a própria demanda da luta pela terra ter uma ligeira queda. Agora não. Há um agravamento das desigualdades sociais e a tendência é que haja uma busca pela reforma agrária muito maior do que houve na última década.

 

Como movimento social, temos de lutar pelos avanços e conquistas da nossa categoria, que vão desde a desapropriação e o assentamento das famílias acampadas até moradia, crédito etc.. Temos também demandas mais graves, provenientes de situações precárias em acampamentos, como, por exemplo, falta de lona, de materiais essenciais para o trabalho e assim por diante. Conjugar as dificuldades econômicas e lutas mais urgentes da base com uma luta política é um grande desafio, sempre colocado pelo movimento.

 

Por isso nós não nos colocamos na oposição ao governo e até publicamente tenho dito que nossas mobilizações não são nem contra e nem a favor do governo Dilma. O que queremos é ver a pauta da reforma agrária atendida. Isso pode parecer ficar em cima do muro, mas, como representante de um movimento social e uma categoria, com uma pauta específica, não me corresponde oferecer apoio ou oposição ao governo. Há uma série de problemas cotidianos que precisam ser negociados. Nossa tática é lutar, conversar, negociar e buscar obter conquistas de forma permanente, sem criar ilusões de que “agora a reforma agrária vai acontecer”.

 

Na minha avaliação, para acontecer a reforma agrária é preciso alterar toda a estrutura de poder e a correlação de forças. E estamos em um momento bastante complicado. Outro ingrediente é o Congresso Nacional, no qual vários projetos estão sendo aprovados, alguns com anuência do governo e outros não, de iniciativa própria do Congresso e contra os interesses dos trabalhadores. É o que acontece, por exemplo, na Assembleia Legislativa do Paraná, que quer votar um projeto de retrocesso da luta trabalhista e dos direitos conquistados pelos professores. O mesmo está sendo feito em todo o Brasil, mas há várias frentes de luta pela reforma agrária, contra os ajustes do governo etc.

 

Temos de fazer uma frente de luta também contra os parlamentos, que estão votando uma série de retrocessos, como o PL 4330. Tem de haver muita mobilização no próximo período.

 

Correio da Cidadania: Nesse sentido, o que pensa das tentativas de criação de uma ampla frente de esquerda que ocorrem ou eventualmente venham a ocorrer, unindo movimentos e partidos progressistas? Como considera que tem sido a postura do MST face a estas tentativas?

 

Gilmar Mauro: O MST está junto da construção desse processo. Eu mesmo, pessoalmente, tenho me envolvido em muitas articulações com o conjunto dos movimentos progressistas. Com enormes diferenças entre si, mas que, na iminência de retrocessos, seja do ponto de vista político, seja do ponto de vista concreto de ataques aos direitos da classe trabalhadora, permitem-se a unificação. É um caminho importante.

 

Temo ainda que a nossa esquerda tenha bastante dificuldades em pequenos detalhes, que estão, muito mais, emperrando processos do que constituindo um amplo leque no campo progressista, a evitar que caminhemos para trás. Precisamos pensar alternativas para irmos para a frente. Mas acho que isso é fruto de um momento histórico. Diria que não é uma particularidade brasileira. A esquerda no mundo todo enfrenta uma crise grave. Mas não adianta ficarmos culpando a esquerda ou um agrupamento ou outro. Falta-nos uma análise um pouco mais profunda das mudanças que ocorreram na economia e, principalmente, no mundo do trabalho, qu,e no meu modo de ver, trouxeram consequências graves para as conquistas históricas dos trabalhadores.

 

Se verificar, estamos agindo muito mais reativamente a iniciativas do governo e de setores da direita do que levando adiante uma pauta propositiva e ofensiva. E a maioria das nossas organizações é de caráter defensivo, foram criadas em momentos como esse, em que o movimento do capitalismo não nos permite ganhos. Aqui no Brasil, na Europa e na maior parte do mundo, nosso movimento vive um período de perdas e as organizações não têm a capacidade de enfrentar esse tempo histórico. Novas categorias surgiram na área de serviços e as organizações sociais não têm capacidade de articulá-las.

 

Eu diria que nós precisamos fazer um balanço profundo, do ponto de vista organizativo e também econômico, uma reestruturação produtiva, das relações dentro das fábricas, contra a precarização etc., e nas nossas formas organizativas, que não conseguem dar conta disso. É o grande desafio. Eu gostaria muito de ter novas formas organizativas para enfrentar o momento, mas não tenho. O que tenho no momento é aquilo que a gente produziu, portanto, é com esse instrumento que vamos fazer o enfrentamento e evitar os retrocessos. Mas eu diria que essa não é a única tarefa, é apenas a lição de casa.

 

Ao mesmo tempo, precisamos construir reflexões e análises que apontem a uma perspectiva de superação do atual cenário. E tal superação passa, talvez, por construir novas experiências organizativas, mais horizontais, que incluam um maior número de pessoas da classe trabalhadora, que hoje estão fora de qualquer forma de organização. São os desafios postos e acho que muitos setores da esquerda não estão se dando conta da necessidade de se reinventar nesse momento histórico.

 

Correio da Cidadania: Como a ideia do “exército de Stédile”, proferida por Lula, como forma de eventualmente se enfrentar “foças golpistas contra o atual governo”, se relaciona com essa conjuntura? Qual é a relevância ou simbolismo dessa ideia no atual cenário político, a seu ver?

 

Gilmar Mauro: Só perguntando ao Lula pra saber exatamente o que quis dizer. Mas vi mais pelo sentido figurado, pois o MST é uma organização de grande capilaridade em território nacional. Até é verdadeira a afirmação, não pela palavra exército, mas porque temos uma militância aguerrida. No dia 31 de março, na quadra dos bancários em São Paulo, falei com toda a tranquilidade que não vamos admitir golpismo sem resistência de massa. Não vamos pra França, para o Paraguai, pra lugar nenhum. Nosso país é esse e vamos ficar aqui.

 

Também acho que a direita sempre teve um lado golpista e continuamos combatendo. Tivemos a recente concessão da Medalha da Inconfidência ao João Pedro Stédile, e resolveram entrar com pedido de devolução. A Rede Bandeirantes fez editorial nos chamando de bandidos… Há um combate da direita ao nosso movimento e, evidentemente, ninguém joga pedra em árvore seca.

 

Além disso, o Lula ainda é uma referência de massa muito grande, é inegável. Os setores de direita têm medo. Mas de certo modo há certo medo da militância, não tanto do MST, e, sim, dos movimentos sociais em geral, que têm militantes aguerridos e mais de uma vez enfrentaram situações difíceis nas lutas recentes.

 

Penso que nesse momento, como em todos, consenso e coerção são coisas que caminham muito próximas. Acho que a elite brasileira tenta criar consenso para justificar ações coercitivas. Por exemplo, a diminuição da maioridade penal foi tão trabalhada na mídia que agora 70% da população apoia. Lembro também a ocupação das fazendas de laranja da Cutrale: apanhamos tanto da imprensa que, se saíssemos na rua naquela região, íamos apanhar da população. Portanto, a tentativa de buscar consenso para ações coercitivas é a tônica do momento.

 

De toda forma, estamos muito tranquilos. Entendendo a gravidade do momento e vendo que não dá para fugir dos temas e desafios atuais da classe trabalhadora. Temos de avançar. São janelas que se abrem. Crise não é sinônimo de avanço, em vários momentos de crise a humanidade acabou indo para trás. Não é à toa que surgiram o fascismo e o nazismo. Mas, em outros momentos, a classe trabalhadora conseguiu vitórias. É um momento importante agora.

 

Gosto muito da ideia de se fazer uma frente de esquerda, que rompa sectarismos e verdades absolutas. Que a gente tenha mais humildade e serenidade e, ao mesmo tempo, esteja atento ao momento, para desencadear um conjunto de ações que nos permita enfrentar os posicionamentos direitistas e fazer a luta de classes avançar no Brasil.

 

Correio da Cidadania: Como consideraria, finalmente, o atual momento e o futuro de mobilização do MST? Pode-se dizer que o movimento enfrenta seu pior momento no que se refere às suas divisões internas, à relação entre dirigentes e bases e à incorporação de novos militantes?

 

Gilmar Mauro: Pelo contrário, não existe isso no momento. Não temos divisões internas, estamos num momento de unidade intensa. Vivemos um momento de crise, mas já foi superado. O movimento, sem dúvida, está mais unificado do que nunca e tem muito claro seu papel, inclusive para além da reforma agrária. Sabemos que temos de cumprir um papel político maior, até porque a reforma agrária não seria nosso papel e, sim, incumbência dos partidos políticos. Mas na ausência de partidos com força, o MST, evidentemente, também cumpre esse papel político.

 

Acho um momento muito bom para o movimento, até no sentido de ter a possibilidade de aumentar as lutas. Mas é claro que vivemos essa crise toda, da esquerda, que afeta todos nós. Há agrupamentos que, hoje, não sofrem ataques da direita e brinco com eles: “cresce um pouquinho pra ver o que acontece”. Porque, quando não incomoda, ninguém ataca. Mas, quando passa a incomodar, os ataques são intensos.

 

Vamos enfrentar nova CPI em São Paulo e talvez em nível nacional. São tentativas da direita de enquadrar, ofuscar e domesticar o MST. Mas não tem como domesticar o MST, pois ele sempre se mantém em luta. Na última década, de fato, houve uma queda nas lutas, por uma série de fenômenos, principalmente econômicos. Porém, minha expectativa é de que se abre um novo período, que permite a intensificação das lutas sociais.

 

Pra concluir, o momento é de desafio para toda a esquerda e estamos inseridos nisso. É preciso requalificar a luta pela reforma agrária, requalificar o MST, as lutas sociais, o papel dos movimentos, a própria relação dos movimentos com o Estado e os governos… Em momentos de crise, há uma linha tênue. Alguns incorrem no erro de cair no reformismo, inclusive ideologicamente. Quero reformas, sou amante das reformas, mas o grande problema é que o capitalismo não as permite. Por isso não queremos apenas reformas, embora também lutemos por elas, até como tática pra discutir com a população.

 

Em momentos de crise, existem dois riscos: um é cair num reformismo desenfreado, que busca saídas emergenciais, até com negociatas etc.;  outro risco é cair no esquerdismo, fazer muito discurso revolucionário sem nenhuma força política. Eu diria que o momento não pede nem reformismo e nem esquerdismo, pois não vão a lugar nenhum. Temos de achar a justa medida para construir formas de resistência e, ao mesmo tempo, caminhos para avançar.

 

 

 

 

 

Entrevista con Unai Aranguren, de via campesina pais Basco, analisa la situacion del agro en europa

“El cambio climático es consecuencia de que el sistema no funciona”

LEANDRO ALBANI/Resumen Latinoamericano, 6 de mayo de 2015 – La actual crisis económica mundial, el avance del agronegocio y los transgénicos, la histórica lucha campesina en todo el mundo, y las propuestas de Vía Campesina para impulsar modelos de producción y de vida que rompan con el actual sistema de consumo, fueron algunos temas abordados por Unai Aranguren, miembro del Comité Coordinador de Vía Campesina en esta entrevista con Resumen Latinoamericano.

 


-¿Cómo es la situación actual del campesinado en Europa?

 -En Europa el campesinado representa solo el 3 por ciento del activo. La crisis se está aprovechando para reducir mucho más los derechos de los campesinos y de las personas en general. Hay una crisis climática, energética y social, sobre todo en el sur de Europa, y los estados han perdido sus soberanías. Los lobbys económicos están diciendo qué medidas tienen que tomar los países: bajar las jubilaciones o desahuciar casas que quedan en manos de los bancos. Ante esta situación, el campesinado tiene una resistencia fuerte. Esta crisis sirve como oportunidad para que muchos jóvenes que están en las ciudades y se han quedado sin trabajo, pero tienen acceso a un pedazo de tierra, puedan empezar un proyecto de autoempleo en el campo. Vemos cada vez más que hay jóvenes que se están planteando, por necesidad y para salir adelante, volver al campo. Ahora mismo somos uno de los pocos sectores que está generando empleo.

-¿Cómo es la presencia de los agrotóxicos y los transgénicos en Europa? -Europa es uno de los continentes que más ha empujado la producción y la venta de agrotóxicos en el mundo. Varias de las empresas más potentes están en Europa y en Estados Unidos. Gracias a la presión de los ciudadanos hemos conseguido que algunas empresas se hayan tenido que cambiar de sede a otros países porque en Europa la presión era muy alta. Pero todavía siguen intentando darle una vuelta de tuerca más y ahora están planteando una nueva revolución verde. Hablan de la agricultura climáticamente inteligente, entonces venden un paquete de semillas modificadas, de abonos y pesticidas modificados que van a ayudar a que las semillas se acoplen mejor a un medio climático cambiantes. Ese cambio climático es la consecuencia de que el sistema capitalista está acabando con todos los recursos del mundo. El cambio climático es una consecuencia de que el sistema no funciona, por eso planteamos cambiar el sistema. Para eso, planteamos que la alternativa política es la soberanía alimentaria, que es el derecho que tienen los pueblos a volver a decidir qué queremos comer y cómo queremos producir. Necesitamos acceso al agua, a la tierra, a las semillas y necesitamos gestionar nuestro territorio. Además necesitamos políticas públicas que acompañen para avanzar en la soberanía alimentaria y hacer frente a las estrategias capitalistas que intentan vendernos productos que dicen que son inteligentes. Para nosotros lo inteligente es la agricultura campesina que se ha hecho toda la vida.

 

 -¿Cómo es la propiedad de la tierra y el agua en Europa?

 -No son tan grandes los espacios de los latifundistas, por lo cual allá lo llamamos el Estado del minifundio. Hay muchas pequeñas parcelas a las que son muy difíciles acceder, porque desde Europa se está financiando y ayudando a esas pequeñas parcelas porque los productos no tienen un coste real, entonces si produces un litro de leche estás perdiendo dinero. Europa te ayuda con un dinero para esas hectáreas y obtener materia prima barata para poder exportar a otros mercados y acapararlos. Es una práctica de dumping que denunciamos. Sí estamos viendo que en algunos lugares hay agresiones hacia la tierra. Se ha puesto bastante de moda el tema de la extracción de gas y el fracking, entonces hay muchas regiones que están luchando contra esa práctica. Los Tratados de Libre Comercio (TLC) que se quieren firmar entre Europa y Estados Unidos van a abrir la puerta a ese nuevo tipo de agresiones hacia la tierra. Ahora hay unos tribunales arbitrarios que lo que quieren es que bajen las leyes para poder aprovechar y explotar mucho más la tierra y los bienes que tenemos.

 

 

-¿Cuál es la situación campesina en África?

 -Las situaciones a nivel mundial son muy parecidas. En África y en Asia también está pasando algo muy parecido con el tema de acaparamiento de tierras, pero en algunos lugares la situación es mucho más dramática que en Europa, porque ya no son las empresas sino también los estados del norte los que están intentando acabar con los recursos. Hay estados como China que están tratando de entrar y meter el morro en África y en Asia para intentar competir a nivel mundial dentro del libre mercado. Los compañeros de África están muy concientizados de que uno de los ejes es la defensa del territorio y de los derechos humanos y las migraciones. Ellos están viendo que la mayoría de los jóvenes africanos no tienen alternativas y están tratando emigrar para países de Europa y cómo evitar eso. Algunas campañas que están haciendo son sobre que es posible ser joven y vivir en África. Están planteando alternativas ligadas a pequeñas producciones, a la venta local y a modelos agroecológicos. Algunos lugares como Senegal o Mali están consiguiendo que los jóvenes se queden luchando en sus tierras.

 

-¿Cómo podrías describir la situación del campesinado en Palestina teniendo en cuenta que es un territorio ocupado por Israel hace sesenta años?

 -Hace unos meses unos compañeros estuvieron en Palestina con una delegación de solidaridad, porque campesinos de Europa fueron y estuvieron compartiendo con los campesinos palestinos. Cuando estamos hablando sobre el acaparamiento de la tierra o sobre la privatización de los bienes, estos casos en Palestina se multiplican por cien. Vieron cómo campesinos a los que se les había destruido en un año tres veces sus plantaciones y cada vez que cultivaban se la volvían a destruir. Esta es una manera que tiene el gobierno israelí para que esos campesinos dejen de serlo y pasen a ser refugiados o abandonen esas tierras. Pero los palestinos y las palestinas tienen la convicción de que esas son sus tierras y quieren seguir trabajándolas, y a pesar de que sigan destruyendo sus olivos, sus huertas y sus fincas, tienen la fuerza de saber que van a seguir trabajando para defender sus derechos a la tierra, al agua, a las semillas y a los conocimientos. Pero ahora no tienen esos derechos asegurados.

 

-Hace más de 10 años en América Latina surgieron diferentes gobiernos progresistas y de izquierda. ¿Qué política se da Vía Campesina ante estos procesos que no están exentos de contradicciones con respecto a la tierra y su utilización?

 -En Vía Campesina es un debate continuo cómo desde las políticas públicas se puede favorecer el avance de la soberanía alimentaria. El avance es muy grande cuando las políticas públicas acompañan. Estamos analizando y trabajando para que diferentes gobernantes, que pueden ser aliados estratégicos y puntuales, avancen en esas políticas públicas. Hay países que han introducido dentro de sus Constituciones el concepto de soberanía alimentaria y hay muchos que llevan años haciendo reformas agrarias. En Cuba hemos visto cómo cuando las políticas públicas acompañan, y cuando un país tiene la necesidad, como Cuba, de producir su alimentación porque está bloqueada, cómo han avanzado hasta conseguir en pocos años el 80 o 90 por ciento de toda su producción. Ahora mismo ellos son autosuficientes y han conseguido una gran parte de la soberanía alimentaria y sobre todo lo han hecho en procesos agroecológicos. Es posible que cuando toma esa determinación el país vuelva a recuperar esa soberanía que en la mayoría de los países los productos llegan de cualquier parte del mundo y los que producimos en nuestros países los mandamos a otra parte del mundo, y en ese intercambio de mercancías el campesino y la persona de a pie nunca gana, solo ganan las multinacionales y las trasnacionales que hacen negocios con las mercancías.

Dia 23 de maio: As razões do Dia Mundial contra a Monsanto

Dezenas de países preparam, em 23/5, protesto contra transnacional que, além de atentar contra ambiente e agricultores, envolveu-se com submundo da política e dos exércitos privados

 Por Luã Braga de Oliveira


 

150506-Monsanto

 

 

Você sabia que existe um Dia Mundial Contra a Monsanto? Muitos não conhecem a empresa pelo nome, ou talvez tenham apenas ouvido falar dela, sem saber ao certo seu setor ou posicionamento. Entretanto, quase todo mundo faz uso contínuo de alimentos a base dos organismos geneticamente modificados (OGMs) produzidos e vendidos pela corporação.

 

O fato é que este ano a Marcha Mundial Contra a Monsanto ocorrerá no dia 23 de Maio e levará milhares de pessoas as ruas, por todo o mundo, para protestar contra a atuação e práticas da corporação. Mas por que existe um dia mundial dedicado exclusivamente à denúncia deste gigante da agroquímica? O que de tão nefasto representa esta empresa? Vamos tentar relembrar os principais fatos da trajetória da Monsanto que a fizeram se considerada pela revista Fortune como “possivelmente a corporação mais temida da América”. Prejuízos aos pequenos agricultores, possíveis danos à saúde e meio ambiente, formação de lobby, manipulação de pesquisas científicas e até a contratação de mercenários são algumas das polêmicas nas quais a empresa se envolveu ao longo de seus 103 anos de existência.

 

A Monsanto é uma multinacional de alcance global da área de agricultura e biotecnologia. É especializada em engenharia genética (produção de organismos geneticamente modificados), sementes e herbicidas. Criada em 1901 como uma companhia novata na área da engenharia química, aos poucos tornou-se a maior empresa do mundo no setor, fornecendo produtos à base de organismos geneticamente modificados para gigantes como a Coca-Cola, a Pepsico e a Kraft. Hoje, controla 90% do mercado de sementes transgênicas do mundo – consagrando-se como um dos maiores monopólios já vistos. O crescimento da empresa foi vertiginoso. Recentemente, ela adquiriu diversas empresas na América do Sul e no Leste Europeu, dominando consistentes fatias de mercado em países como Argentina, México e Brasil – onde está presente há quase 60 anos.

 

Este crescimento tem representado uma ameaça real à sobrevivência de pequenos produtores em todo o mundo. Em seus contratos de venda de sementes, a Monsanto prevê que os pequenos produtores não poderão guardar nenhuma semente e são obrigados a permitir que a empresa vistorie suas plantações a qualquer momento. Além disso, as sementes geneticamente modificadas são apenas tratadas com os herbicidas vendidos pela própria companhia, fato que condiciona os agricultores à dependência. De todo modo, os impactos dos produtos geneticamente modificados comercializados pela Monsanto vão além da esfera socioeconômica.

 

Um estudo de 2009 do Journal of Biologycal Science¹ mostrou que o consumo do milho proveniente da semente geneticamente modificada pode produzir efeitos negativos em órgãos como os rins e o fígado. Outro estudo, publicado em 2012 na Food And Chemical Toxicology², constatou que ratos submetidos a uma dieta à base de organismos geneticamente modificados morrem mais rápido e são mais propensos ao desenvolvimento de câncer. Para chegar a esta conclusão, cientistas administraram em 200 ratos, durante dois anos, três dietas distintas: uma à base de milho convencional, outra a base do milho transgênico NK603 e outra a base do NK603 tratado com o herbicida RoundUp. Tanto o milho transgênico NK603 como o herbicida RoundUp (o mais utilizado do mundo) são pertencentes à Monsanto. O resultado foi a morte acelerada de parte dos ratos e o aparecimento de tumores enormes naqueles cuja base da dieta fora o milho transgêncio NK603, da Monsanto.

 

A pesquisa divulgada pela Food And Chemical Toxicology gerou controvérsias. Enquanto recebeu o apoio de diversos cientistas pelo mundo, alguns a criticaram, afirmando que houve viés na metodologia, o número de ratos fora inadequado e aquele tipo de rato de laboratório já possuía propensão ao desenvolvimento de tumores. Após forte pressão, a revista cedeu e, um ano depois, anunciou a retirada do estudo por ela publicado. A decisão, todavia, não agradou ao principal autor da pesquisa – o diretor científico do Comitê para Investigação e Informação Independente sobre Engenharia Genética da França, Gilles-Éric Séralini. O cientista reafirmou que a pesquisa não continha fraudes e que, caso a revista insistisse em sua decisão de retirar a publicação, iria acioná-la judiciamente por danos morais. A despeito da pesquisa de Séralini, outras pesquisas ao longo das décadas já confirmaram em condições similares os efeitos dos organismos geneticamente modificados sobre a saúde humana. Além disso, as empresas que controlam o setor – sobretudo a Monsanto – possuem altos níveis de poder acumulado, que lhes permite interferir em pesquisas e políticas públicas por meio da formação de lobby para benefício de seus produtos.

 

Dessa forma, o poder econômico acumulado pela Monsanto lançou as bases para um acúmulo significativo de poder político. Executivos da Monsanto foram posicionados em cargos estratégicos do governo dos Estados Unidos — dentre eles, a Agência de Proteção Ambiental [“Environmental Protection Agency”, EPA], o ministério da Agricultura [U.S. Departament of Agriculture”, USDA] e o Comitê Consultivo do Presidente Obama para Política Comercial e Negociações. A Monsanto ainda posicionou funcionários em cargos estratégicos em universidades pelo mundo, dentre elas a South Dakota State University, o Arizona State’s Biodesign Institute e a Washington University. Desde 1980, políticas federais americanas têm incentivado instituições públicas de ensino a produzir pesquisas nas áreas agrícola e de biotecnologia em parceria com empresas privadas. Em consonância com esta política, a Monsanto tem inundado instituições públicas de ensino com investimentos. Em troca, tem seus produtos protegidos e fortalecidos por um arcabouço de pesquisas técnicas e científicas com viés favorável.

 

Além de cargos no governo e na academia norte-americana, executivos da Monsanto posicionaram-se em cargos em instituições-chave para política alimentar e científica de seu país ou de âmbito internacional, como o “International Food and Agricultural Trade Policy Council”, o “Council for Bitechnology Information”, a “United Kingdom Academy of Medicine”, a “National Academy of Sciences Biological Weapons Working Group”, a “CropLife International” e o “Council of Foreign Relations”.

 

Naturalmente, as posições privilegiadas alcançadas pela Monsanto renderam-lhe excelentes retornos. Em 1993, a Agência para Alimentação e Medicamentos [Food and Drug Administration”, FDA] dos EUA aprovou o uso de um produto denominado “Hormônio de Crescimento Bovino” [Recombinant Bovine Hormone, ou rBGH]. Desenvolvido pela Monsanto, trata-se de uma droga hormonal injetada em vacas de modo a incentivar a produção de leite. O rBGH foi a primeira substância geneticamente modificada aprovada pelo FDA.

 

A aprovação foi no mínimo controversa. Estudos apontaram que o rBGH produziria sérios impactos na saúde física e psicológica das vacas. O mais comum deles, a mastite bovina, é tratada com base na administração de antibióticos. A exposição constante das bactérias aos antibióticos contribui para a criação de bactérias resistentes que podem infectar seres humanos. Além disso, alguns estudos também apontaram que o consumo do leite com resíduos do hormônio aumentaria o risco de desenvolvimento de câncer de colo, de mama e de próstata. A substância é proibida nos 27 países da União Europeia, mas graças ao poderoso lobby da Monsanto nos EUA sua utilização é liberada – o que também ocorre no Brasil…

 

Após a aprovação do uso do rGHB pelo FDA, funcionários ligados à Monsanto que trabalhavam na FDA foram investigados pelo Escritório de Prestação de Contas do Governo [Government Accountability Office” (GAO)] por formação de lobby. O GAO investigou os executivos Michael Taylor, Margaret Miller e Suzanne Sechen. Os três funcionários tiveram ativa participação no desenvolvimento da droga e, posteriormente, exerceram funções na FDA, tornando-se responsáveis pela avaliação e aprovação do produto que ajudaram a desenvolver. Ao fim da investigação, o GAO concluiu que não havia dispositivos legais para incriminar os envolvidos e que não havia provas cabais de conflitos de interesses no caso.

 

Em 2012, a empresa opôs-se à chamada Proposition 37 – apelidada pelos americanos de Iniciativa pelo Direito a Saber [Right to Know initiative]. A iniciativa propunha-se a promulgar, no estado da Califórnia, uma lei obrigando as empresas que vendessem produtos à base de ingredientes geneticamente modificados a neles instalarem rótulos visíveis alertando para tal fato, evitando assim a venda destes produtos como naturais. Esta iniciativa, no entanto, não passara incólume pelo imenso poder de barganha das grandes indústrias do setor, sendo a Monsanto sua “ponta-de-lança”. Empresas como Nestlé e Mars Inc. despejaram mais de 370 mil dólares em campanha contra o projeto. Só a Monsanto despejou, sozinha, 8,1 milhões de dólares em campanhas contra a iniciativa, estabelecendo-se como doadora majoritária em uma campanha que totalizou 45 milhões de dólares arrecadados de diversas empresas envolvidas na derrubada da proposta. É claro que com todo este empenho a iniciativa não prosperou e os californianos não conquistaram o direito de saber a procedência do alimento estão ingerindo.

 

No Brasil, a Câmara dos Deputados aprovou, em 28 abril deste ano, por ampla maioria o Projeto de Lei 4.148/2008³, de autoria do deputado ruralista Luiz Carlos Heinze (PP-RS), que ao contrário da legislação vigente (baseada na Lei 11.105/2005) propõe a não obrigatoriedade da rotulagem de alimentos a base de OGMs.

 

Para além das polêmicas e controvérsias citadas até agora, a Monsanto ainda guarda em sua história íntimas relações com o poder militar. É fato público e conhecido o fornecimento do famoso Agente Laranja lançado nas plantações do Vietnan pelas forças armadas norte-americanas que guerreavam para manter o país sob dominação. As consequências, entre as populações que serviram de alvo, foram sentidas por muitos anos. O que pouco se sabe é que há indícios de ligações da Monsanto com forças militares mercenárias. A empresa contratou serviços de espionagem de empresas ligadas a conhecida antiga Blackwater (agora XE) – uma das maiores companhias militares privadas do mundo. Segundo documentos obtidos pela revisgaThe Nation4 a empresa usou de serviços oferecidos por duas empresas de espionagem – “Total Intelligence Solutions” e “Terrorism Research Center” – cuja propriedade é do dono e fundador da XE, Eric Prince. Os documentos apontam que entre os serviços prestados à Monsanto por estas empresas estão a infiltração de espiões em movimentos sociais, ONGs e entidades protetoras dos animais e de combate aos transgênicos. Alguns sugerem que esta relação da Monsanto com empresas de espionagem explique o misterioso vírus que atacou os computadores de ativistas da organização “Amigos da Terra” e da “Federação para o Meio Ambiente e Proteção à Natureza” da Alemanha. O ataque se deu no contexto de apresentação de uma pesquisa realizada por estas entidades sobre os efeitos da substância glisofato no corpo humano. O glisofato é base de um dos produtos mais rentáveis vendidos pela monsato – o herbicida RoundUp. A empresa afirmou que não teve e jamais teria envolvimento no fato.

 

O histórico e a atuação da Monsanto no seu setor, considerando todas as polêmicas e controvérsias nas quais a corporação se envolveu, trazem à tona o necessário debate acerca dos custos e benefícios envolvidos no desenvolvimento de organismos geneticamente modificados. Se por um lado a biotecnologia e a agroquímica trouxeram crescente otimização da produção e distribuição de insumos, é necessário refletir acerca das consequências do uso destes insumos, da garantia da liberdade de pesquisa com relação a seus efeitos e principalmente das consequências da extrema concentração deste mercado nas mãos de pouquíssimas corporações. Afinal de contas, como dito, não é todo dia que uma empresa ganha um Dia Internacional de protestos contra si.

 

A maior parte das informações aqui relacionadas pode ser encontrada no relatório “Monsanto: A Corporate Profile”, da ONG Food & Water Watch. Além disso, o portal “Esquerda.net” possuiu um dossiê completo da empresa e sua atuação pelo mundo. Para os que preferem material audiovisual, existe uma série documentários que tratam de maneira crítica da questão dos transgêncios e das poderosas corporações do setor. São alguns deles eles: “Food Inc”, “The future of Food”, “El Mundo Según Monsanto” e “Seeds of Free”. O site oficial da Marcha Mundial Contra a Monsanto pode ser acessado em: http://www.march-against-monsanto.com/.

 

REFERÊNCIAS

 

¹ Disponível em : http://www.ijbs.com/v05p0706.htm

 

² Disponível em: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0278691512005637

 

³ Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=412728

 

4 Disponível em: http://www.thenation.com/article/154739/blackwaters-black-ops#

 

 

 

De tijolo em tijolo, Sem Terra construíram a primeira escola do campo

Fotos: http://goo.gl/CwsYCr

A Escola Madre Cristina, a primeira escola do campo no Mato Grosso, traz a realidade do campo para dentro da sala de aula.

6 de maio de 2015 Por José Coutinho Júnior Da Revista Sem Terra


O assentamento Roseli Nunes pode ser visto como um símbolo de resistência da Reforma Agrária no Estado do Mato Grosso. Sua área de mais de 7 mil hectares, onde moram cerca de 325 famílias, está cercada por grandes latifúndios do agronegócio, que muitas vezes contaminam a produção dos assentados com agrotóxicos.  

O Mato Grosso é um dos estados que mais concentra terras no Brasil. 69% das áreas rurais são latifúndios acima de 3.500 hectares, de acordo com a cartilha lançada pelo Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo, em 2010.

Mesmo assim, o assentamento resiste e produz uma diversidade de alimentos, proporcionando às famílias assentadas uma condição de vida digna. Cada núcleo do assentamento tem uma área social, onde se constroem escolas, igrejas, postos de saúde.

Os agricultores produzem leite, milho, batata, mandioca, arroz, banana, abóbora, laranja, manga, melão, abacaxi, melancia, feijão, verduras e diversos tipos de legumes. O trabalho agroecológico da região começou no assentamento, em 2004. Hoje, 60 famílias assentadas produzem alimentos livres de agrotóxicos.

Além da produção, o assentamento Roseli Nunes é referência na área da educação. A escola Madre Cristina, primeira escola rural do estado, se localiza no centro do assentamento, e proporciona aos alunos, professores e assentados uma forma de ensinar no campo e se integrar com a comunidade raramente vista em outras escolas.

Atualmente, a escola conta com cerca de 360 alunos do ensino fundamental, médio e do programa de Educação de Jovens e Adultos (EJA) do assentamento Roseli Nunes.

Na época de sua fundação, em 1997, uma lona era a sala de aula dos alunos. Após o assentamento ser criado, em 2002, cada assentado doou R$ 50 para a compra de materiais, e um mutirão construiu a escola.

Segundo Damião, assentado que participou da construção da Madre Cristina, “a importância da escola é que ela é diferenciada. Além de aprender as matérias normais, os alunos aprendem sobre produção, a respeitar a natureza, como nos proteger do veneno, que para nós é um grande problema”.

Ao todo, a escola tem sete salas de aula em dois pavilhões. Quatro à direita, no pavilhão maior, e três à esquerda, no menor. Um jardim divide os dois pavilhões, e em frente a cada sala de aula, há uma planta diferente, plantada e cuidada pelos alunos daquela sala.

No pavilhão maior, ainda há um laboratório de informática com 19 computadores, uma sala de aula para alunos com necessidades especiais e o refeitório. Os alimentos adquiridos pela escola são todos agroecológicos, vindos tanto do Roseli Nunes como de outros assentamentos próximos.

A escola serve um café-da-manhã, almoço, lanche da tarde e janta aos alunos. Alunos, professores e funcionários comem juntos no refeitório. Merendas como sopa de legumes e carne, macarrão com carne e arroz com farofa são servidas regularmente.

Arroz, feijão e carne

Nadimar trabalha como merendeira da escola desde 2001. É assentada do Roseli Nunes, e começou a contribuir na escola porque à época não havia como pagar uma merendeira. Quando a escola obteve o recurso, contratou-a.

Seu filho estudou até a quinta série na escola, e agora são seus netos que frequentam a Madre Cristina. Para Nadimar, trabalhar na escola é uma alegria.

“Chego às 10 horas e fico até às 17. Quando chego já cozinho o arroz, feijão, a carne moída. Os alunos adoram a comida. Adoro trabalhar aqui, se eu sair daqui me dá uma depressão, minha vida é vazia demais sem essa escola, sem os professores, as meninas da limpeza, parece uma família”.

Ao lado do refeitório, há uma árvore cercada por um banco de madeira, onde os alunos sentam para conversar durante o intervalo. Seguindo pelo refeitório, há a sala da coordenação, dos professores e a pré escola. Há também uma grande sala reservada para a biblioteca, que tem um acervo de mil livros, que podem ser emprestados não só para os alunos, mas à comunidade.

A escola também tem duas quadras próximas à sua entrada: uma de esportes, e outra destinada ao projeto +Educação, que realiza oficinas de teatro, artesanato e dança com os alunos.

Pedagogia do campo

A estrutura da escola é bem modesta, e não se diferencia em nada de outras. No entanto, a Madre Cristina é uma escola muito diferente quando se trata das aulas e da relação com a comunidade.

Ela só existe por conta da mobilização dos funcionários e assentados. “Sempre houve muito preconceito por sermos uma escola do campo. Tentaram fechá-la várias vezes, e para conseguirmos abrir novas turmas, sempre tínhamos de nos mobilizar”, afirma a diretora Maria José de Souza Gomes.

Hoje, a escola é estatal, e não mais municipal, mudança que ajudou nas negociações para realizações de projetos, aquisição de equipamentos e seu funcionamento diário.

Para Maria de Lurdes Paixão, assessora pedagógica da Secretaria de Estado de Educação (SEDUC), a escola “dá condições do jovem continuar no campo, pois a vivência dela é muito relacionada à vivencia dos acampados. A história do assentamento e do Movimento vem para a sala de aula.”

Ainda há dificuldades a se superar, mas Maria de Lurdes acredita que com o tempo a equipe irá resolvê-las. “Aqui me dizem que essa escola é do campo e no campo. E a metodologia é realmente diferente. Trabalhar com a equipe é tranqüilo. Eles mesmos elaboram a linha e o método dos projetos, e cabe a nós acompanhar e assessorar”.

Da mesma forma, os professores têm a liberdade de criar projetos e suas próprias metodologias nas aulas, sendo que alguns realizam atividades em conjunto. Ronaldo de Queiróz, professor de matemática, notou que os alunos precisavam melhorar suas capacidades de raciocínio.

“Vamos cortar um tronco para fazer um tabuleiro, na aula de artes os alunos vão fazer peças de damas, e vamos começar um torneio de damas entre os alunos de todas as turmas. Isso vai incentivar o raciocínio de uma forma divertida”.

Renata Cristiane, professora de física, acredita que a forma de ensinar a disciplina nas escolas está errada. “O MEC (Ministério de Educação) divide a física em movimento no primeiro ano, calor no segundo e eletricidade no terceiro. Mas essas coisas estão interligadas, separar só torna o ensino muito difícil. Então muitas vezes eu chego na sala e começo a falar de física para os alunos, eles vão perguntando e vamos debatendo”.

A professora também desafia seus alunos, que para se formar, precisam entregar uma monografia sobre um tema de sua aula. “Estudamos nas aulas as normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), e os trabalhos que saem costumam ser muito bons”. Renata também leva livros das universidades para resolver os exercícios com os alunos.

“Faço isso para eles perceberem que são tão capazes quanto os alunos da cidade, porque às vezes eles tem essa impressão de que não são tão bons, e fazendo isso a gente tira essa ideia da cabeça deles”.

Da sala a horta

A escola iniciou neste ano um curso técnico de agroecologia para os alunos do ensino médio. O curso dura três anos, e os alunos vão estudar o funcionamento de agroindústrias, agropecuária de base ecológica, além das técnicas agroecológicas na prática, cuidando de uma horta na escola.

De acordo com Sidney Martins, engenheiro agrônomo e assentado do Roseli Nunes, que ministra o curso, esse “é um aprendizado importante, para levar para casa, porque além de ser uma forma de produzir alimentos saudáveis, abre uma nova porta de comércio para as famílias”.

A vivência cultural na escola também é forte. Ano passado, os estudantes do EJA realizaram um festival culinário, onde cada um levou um prato diferente. “Reservamos uma mesa no refeitório, mas como não parava de chegar comida, precisamos pegar mais”, afirma Maria José, rindo.

A escola também realizou em maio uma noite cultural, onde foram apresentadas poesias e trabalhos artísticos dos alunos. Todos esses eventos não são restritos aos alunos e professores; pelo contrário, os assentados também participam.

 “Os assentadados participam da rotina da escola. As assembleias principais do assentamento são aqui, eles acompanham o desempenho dos alunos e também avaliam os professores”, diz Maria José.

EJA

 

Além do ensino fundamental e médio regular, a escola Madre Cristina dá grande atenção ao EJA. Cerca de 100 dos 360 alunos da escola são do EJA, e muitos destes alunos nunca tinham entrado numa sala de aula durante toda sua vida.

 “Quando comecei a estudar, não sabia nada, agora até sei escrever uma cartinha. Ficamos felizes de estar nessa sala com as amigas e colegas, a gente se sente melhor. Nunca tinha vindo na escola. Tenho 73 anos e achava que não ia aprender nada mais por causa da idade. Mas os professores são bons, entendem as nossas dificuldades e ajudam muito. Esse tempo de estudar era pra ser na infância, como não tive…” diz a assentada Araci Lourinda.

Para as pessoas que não completaram os estudos, o EJA não é apenas uma oportunidade de aprender, como também de se emancipar por meio do conhecimento. O maior exemplo disso é a “sala das margaridas”, composta apenas por mulheres que abandonaram os estudos por conta do casamento, e agora retornaram à sala de aula.

“Minha vida parou na sétima série, quando me casei. Meu marido não vê importância de estudar, e eu fui proibida de realizar meus sonhos. Hoje tenho 37 anos e faço planos com muita segurança pro meu futuro. Se Deus quiser, ano que vem vou fazer meu curso de culinária para abrir meu restaurante”, afirma Luciene Correia da Costa.

As margaridas brincam que “nessa turma não teve nenhum homem para encarar. Ninguém quis entrar. Entraram por algum tempo, mas já foram embora”, dizem rindo.

Para a professora Iraci da Silva Pereira, lecionar para o EJA é uma experiência gratificante. “A experiência deles passa pra mim e a minha passa para eles. Essa troca de conhecimento é muito importante. Não existe isso de que ninguém sabe nada, todos sabem algo. É um processo bem lento de aprendizado, cinco dos meus alunos precisaram de aulas de alfabetização. Mas quando eles aprendem eu me emociono muito”.

Segundo Maria José, é função da escola ir atrás e abrir as portas para que todos possam aprender. “Como eu tive oportunidade, quero que os outros tenham. Estamos de portas abertas para os alunos depois de se formarem.”

A todos que precisam e queiram

A filosofia da escola de chegar a todos que precisam e queiram aprender também se estende à educação especial. Uma sala ao lado do laboratório de informática, chamada de “sala educacional” é onde estes alunos tem suas aulas.

A professora Marinalva Paula da Silva trabalha na sala educacional há cinco anos. Além da formação em letras, ela fez cursos de braile e libras para lecionar para essas crianças. Atualmente há sete alunos na sala, com problemas que variam de paralisia cerebral, surdez e baixa visão.

As aulas são diferentes das tradicionais, focando em jogos no computador, artesanato, pintura, colagem e atividades de leitura. “Nos jogos como dama e dominó eles dão um banho em mim. Eu não trago nenhuma atividade pronta, instigo eles a fazer”, afirma Marinalva.

Em relação ao progresso dos alunos, ela acredita que é pequeno, mas notável. “O Fábio, que tem paralisia cerebral, usava mamadeira até os 14 anos de idade. Hoje ele não faz mais isso, ensinamos a mastigação.Ele conhece a minha voz, meu cabelo é áspero, então quando chego passo a mão dele no meu rosto e no cabelo, e ele sorri porque me reconhece”, diz a professora.

Em relação à forma como essas crianças muitas vezes são tratadas em outras escolas, que não tem o preparo para lidar com suas necessidades, Marinalva acredita que “muitos professores acham que isso não é papel da escola. Mas todos têm o direito de vir para a escola, e a escola tem de chegar às pessoas. As escolas têm de ir atrás, porque é um direito”.

Desafíos del MST y del movimiento social lationamericano. Entrevista a Simone Silva- Coordinadora Po

Militante del Movimiento de Trabajadores Rurales Sin Tierra de Brasil (MST). Integra el Sector de Formación política y la Dirección política de la formación en el MST. También hace parte del colectivo de mujeres dirigentes del Movimiento Sin Tierra. Vive actualmente en la Escola Nacional Florestán Fernandes donde realiza tareas de Coordinadora Política y Pedagógica de la misma. Tiene un Master en Desarrollo territorial, donde aborda los desafíos de construcción de la soberanía alimentaria en el nordeste brasileño.

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Entrevistas | Pachakuti | 27-04-2015 |

P:- Simone, bienvenida a estos territorios. ¿cuál es el objetivo de tu gira?

S:-La Escuela Nacional Florestán Fernendes completa diez años y el objetivo de esta gira en un primer momento es la divulgación de la Escola y la importancia de la formación política como un instrumento para elevar el nivel de conciencia de la clase trabajadora pero sobretodo de construir de construir una identidad internacionalista , divulgar las luchas del Movimiento Sin Tierra y del campesinado en América Latina , así como seguir denunciado a las empresas y grandes monopolios de alimentos que amenazan la construcción de la soberanía alimentaria   P:-¿Cual es el papel de la educación popular para el desarrollo de la soberanía alimentaria en las zonas rurales de luchas campesinas?   S:-La educación popular es un instrumento muy importante porque se preocupa con las personas que tienen posibilidad de construir un análisis de la realidad, una lectura crítica de la realidad, devolviendo protagonismo a ese sujeto.. un instrumento para que las personas tengan formación sobre sus derechos , sobre los alimentos considerados no como mercancía sino como derecho a buena comida sana de calidad, y para la soberanía alimentaria la educación popular es una herramienta de concienciación y posibilita que la gente se apropie de una matriz tecnológica basada en la agroecologia y también en la soberanía alimentaria.   P:- ¿Cuantos jóvenes Sin Tierra hay en Cuba estudiando? y ¿Qué están estudiando?   S:- En Cuba, en su proyecto de solidaridad con el mundo, también cumplen un papel muy importante con el campesinado pobre de Brasil. 130 jóvenes estudiaron en Cuba, la mayoría medicina, pero también agronomía, veterinaria, historia del arte, porque la gente cree que para construir la emancipación tenemos que estudiar todas las dimensiones, y también tuvimos algunos estudiantes en maestrías de agroecología.   P:- ¿Cuantas escuelas están organizadas en el MST?     S:- Tenemos una base de 68.000 escuelas de educación primaria, y una media entre 120 y 150 escuelas de formación política por todo el territorio brasilero , pero también hacemos una gran lucha porque muchas escuelas del campo están siendo cerradas, más de 30mil en los últimos años, no todas en áreas del MST pero sí en comunidades rurales , es decir que por más que el MST esté construyendo escuelas en las comunidades donde se asienta muchos otros trabajadores que no están organizados están perdiendo sus escuelas..   P:- ¿Qué son los IALA- institutos de Agroecología Latinoamericana?   S:-   P:- ¿ cuál es la importancia de los Comités de Amigos y Amigas del MST para con la Escuela ENFF? ¿Cómo podemos contribuir para la conservación y sostenibilidad de la misma?   S:- Es muy importante ese trabajo y se materializa en una estrategia que garantiza el fortalecimiento del MST en base a la Solidaridad Internacional, y como en Brasil no se consiguen apoyos económicos para la formación política , porque es una formación de emancipación , de formación de una conciencia crítica, participativa, organizativa, entonces los comités nos han apoyado mucho en eso. Que puede darse de varias formas; una primera esa Solidaridad Internacional de ayudar a divulgar las luchas del Movimiento y ayudar a divulgar la importancia de la formación política, una segunda que es una contribución más puntual que es el apoyo económico cuando se puede enviar alguna cantidad de dinero para que la gente pueda seguir contribuyendo , con pasajes, con compra de libros, que son dos aspectos muy caros, mientras que la alimentación general de los estudiantes se consigue con los aportes de los asentamientos del MST. Todo ello fortalece mucho a la organización.

P:- las mujeres campesinas organizadas.. en el caso brasilero.. ¿jugáis un papel específico en la construcción de economía campesina?

S:-Sí, las mujeres campesinas en Brasil tienen una contribución muy importante…. Cuando se dan cuenta que la llamada seguridad alimentaria no sirve porque es usada por las grandes empresas y también por el estado y que significa solamente tener acceso a la comida pero no la producción de calidad.. las mujeres han tenido ese protagonismo: llamando la atención de la importancia de una protección de la naturaleza , la construcción de la Soberanía alimentaria , muy por encima de la seguridad, y también en la cuestión de reafirmar y hacer una lucha directa contra el capital cuestionando los transgénicos , la modificación de las semillas nativas, la concentración de la tierra, y la inversión de valores que no respeta a la colectividad… por eso en este periodo de abril en el Congreso de la CLOC las mujeres campesinas reafirmaron que el sentido de las luchas es un sentido feminista por la autonomía y emancipación de las mujeres, es una lucha campesina, por la preservación de la biodiversidad, de los alimentos , de los recursos naturales, y también es una lucha popular porque contribuye y tiene por objetivo la emancipación de la clase ; para la liberación de las mujeres tiene que ocurrir la liberación de la clase trabajadora , y en eso las mujeres tienen un papel fundamental a la hora de decidir los rumbos de esas luchas y los marcos en que esa práctica política tiene que ser construida en este periodo próximo.

P:- Y un momento pedagógico de esas luchas de las mujeres.. ¿ en este 8 de marzo que se hizo..?

S:-Este año se movilizaron 30mil mujeres en todo el país y uno de las decisiones importantes fue crear hechos políticos para que la sociedad debata los problemas.. por ejemplo: las mujeres ocuparon y destrozaron varios canteros de eucaliptos transgénicos que estaban propagándose cuando en Brasil todavía esos árboles no están permitidos, y esa acción de las mujeres, destruyendo esos canteros, es una acción para llamar la atención de la sociedad y del estado para discutir la problemática que los transgénicos traen consigo así como el uso masivo de venenos , y en paralelo se realizaron cortes de vías, reparto de alimentos , ocupaciones de tierras.. no es una lucha que se diferencie mucho de la del conjunto del movimiento, pero los jóvenes y las mujeres acentúan de forma más directa la confrontación con el gran capital.

P:-Mientras estabas por acá se celebraba el Congreso de la Vía Campesina-CLOC en Argentina.. ¿sale fortalecida la CLOC frente al monstruo Monsanto y demás transnacionales, y para dónde va la secretaría continental..?

S:- Sin ninguna duda. Cada Congreso fortalece las conducciones, se fortalece la identidad como campesinado latinoamericano, pero sobretodo se colocan de forma conjunta las líneas de acción para el próximo periodo.. el movimiento campesino sale fortalecido porque ha tenido la posibilidad de discutir y construir las estrategias para las luchas venideras en ámbitos de transformación social.

P:- ¿Gobierno popular u organización popular? ¿Construimos la organización o tomamos el poder?

S:- Una de las razones de la sobrevivencia del MST es la independencia de los gobiernos. Tienen clara la importancia de que lleguen al poder gobiernos progresistas, como por ejemplo, cuando llega el PT, pero también está claro que las organizaciones sociales no deben estar sometidas a los gobiernos, sino que deben demandar su autonomía y mantener la lucha, en función de su condición de clase.

P:- El pueblo organizado y la lucha por los derechos es lo que da las conquistas.

S:- Con el gobierno del PT no se ha conseguido nada, si no es por la lucha.

P:- ¿Alianza entre el campo en la ciudad? ¿Unión entre indígenas y trabajadores..?

S:- El MST lleva 30 años de lucha y resistencia en Brasil, en cada región del país se han ido forjando alianzas diferentes, con sindicatos, profesores, con trabajadores urbanos. La lucha es de los campesinos, pero también es la lucha de los trabajadores de América Latina. Hay que trabajar en doble vía, porque la movilización en la ciudad también es necesaria, las mujeres y los jóvenes son los que han promovido más esta lucha. Pero la lucha está unida a la formación política.

Es necesario resaltar la importancia de la unidad de las luchas. Es necesario dar una lectura más globalizada de la ofensiva. Ver qué cosas hay en común, cuál son las luchas en común, entre campo y ciudad, entre trabajadores e indígenas. Tanto el MST como el movimiento indígena luchan por la preservación de sus tierras para poder vivir, por el acceso a cuestiones políticas, sociales, culturales, pedagógicas y humanas, por el acceso a la educación, a la producción, al conocimiento.

P:- ¿Cuáles son los desafíos del MST y del movimiento social latinoamericano?

S:-

1. Avanzar hacia una producción más cualificada en los asentamientos. Agroecología

2. Formación política de las bases. Brasil es un país con mucho analfabetismo, en la región de Marañón, más de 174000 personas analfabetas, contra lo que hay que luchar también

3. Alianzas. Formación política. Organización de mujeres y jóvenes. Formación de una estructura nacional que permita el fortalecimiento. Vía Campesina. Que las Escuelas lleguen y proliferen en otros lugares de AL. Se busca reproducir el esquema de la ENFF en otros países, con sus propios activistas para replicar y dar más fuerza al proceso

4. Enfrentamiento al imperialismo que coloca al capital en el centro. Lucha por los pobres que se organicen en cualquier parte, lucha por la soberanía alimentaria, contra los transgénicos, etc.

P- Naciones Unidas plantea que la solución es volver al campo con agricultura más orgánica. ¿Es posible construir la soberanía alimentaria a partir de cada territorio?

S:- Se trata de no transformar la producción orgánica en un monocultivo, porque se destruye nuevamente la biodiversidad. El acceso a la tecnología es preciso, para hacer una producción no sólo local, sino a mayor escala, pero que no dará paso a transgénicos, ni a agrotóxicos y que apueste por la soberanía alimentaria. No basta con el agua o la tierra, hace falta la tecnología para poder avanzar.

Un aspecto que hay que cuidar, es que no se pierdan las fuentes de agua al avanzar la frontera agraria. Es necesario aprovechar el agua de la lluvia. Este es un debate que se tiene desde hace tiempo a lo interno y que no se entiende a veces. Hay comunidades que hacen su lucha por la preservación del agua, pero son luchas muy solitarias y localizadas, que no tienen demasiada repercusión

En Brasil cuando se compran las tierras, se compran las fuentes de agua que hay en ellas. Entonces todo pasa por un proceso de denuncia inicial, para concienciar a la población, que es el paso previo para organizar la resistencia.

Frente a las hidroeléctricas que se quieren implantar en el país, se realizaron 6 meses de trabajo de base, para luego pasar a la lucha, trabajo con el municipio, en los telecentros, con mucha propaganda.

En el caso de minería, hay uranio y gas.

También se ha luchado frente al a plantación de eucaliptos transgénicos y ahí las mujeres tuvieron un papel clave. Las luchas son criminalizadas, porque dicen que se destruye una especie muy beneficiosa

P:- ¿Cuál es el rol de las mujeres y los jóvenes?

S:- La organización de mujeres ha dado grandes pasos en su empoderamiento. El 50% de las dirigentes nacionales son mujeres. No es una ecuación, sino que las necesidades y demandas femeninas deben ser respetadas. Las mujeres sufren la presión del Estado, del patriarcado, de la clase. El papel de la mujer es fundamental, no sólo en la producción de alimentos, sino en su papel como guardianas. No se adopta el feminismo de clase, sino el feminismo como dimensión política. Las mujeres no son una isla aparte. Las condiciones son las mismas. Las mujeres han liderado la lucha contra el gran capital, cada vez más opresor. También han tenido un papel fundamental en el fortalecimiento de la organización

P:- Muchas Gracias Simone.

Para quienes quieran apoyar a la Escola Nacional Florestán Fernandes..

Esta es la cuenta abierta en nuestro país:

APOYO ENFF: COMITES AMIGOS Y AMIGAS MST

Banco Popular ES87-0075-0128-80-0600524453

 

 

Mais médicos, mais saúde

Frei Betto

        O programa Mais Médicos conta, hoje, com 18.247 profissionais atuando em mais de 4 mil municípios do país. Neste ano, o número de brasileiros(as) a serem atendidos chegará a 63 milhões.


        O atendimento dos médicos inscritos no programa chega a ser personalizado, segundo a metodologia do sistema Médico da Família, que permite ao profissional cuidar, não tanto da doença, e sim da prevenção. A saúde é um direito e a sua progressiva mercantilização põe em risco a vida de inúmeras pessoas que não podem pagar pelo tratamento.

        Pesquisa da UFMG-Ipespe constatou que 95% dos beneficiários entrevistados estão satisfeitos com a atuação dos médicos, dos quais 84% estão no Norte e Nordeste. Naquelas regiões, 86% dos municípios têm ao menos 20% de sua população em situação de extrema pobreza.

        Vale observar que, nas vagas disponibilizadas pelo programa, a prioridade cabe a médicos brasileiros. Como os que se inscreveram no Mais Médicos são insuficientes para atender a população, o governo destinou as demais vagas a brasileiros graduados no exterior e, em seguida, a médicos estrangeiros. Há profissionais de 50 nacionalidades atuando no Brasil.

        Os cubanos são cerca de 14 mil, presentes em 2.700 municípios. Em geral, os mais pobres e mais distantes dos grandes centros urbanos.

        Os médicos cubanos trazem a experiência de solidariedade e cooperação internacionais, já que Cuba presta serviços médicos, hoje, em 67 países. Até o governo dos EUA elogiou a atuação dos profissionais da ilha socialista no combate à epidemia de ebola na África.

        Não são apenas médicos que o Brasil importa de Cuba. Além de medicamento para a hepatite B, desde o governo Collor nosso país compra a vacina de combate à meningite, única no mundo.

        O projeto ora apresentado no Senado contra o Mais Médicos é um acinte a tantos brasileiros que, pela primeira vez, recebem atendimento domiciliar de saúde. O direito à saúde está acima de ideologias. Partidarizar um programa que traz benefícios a quase 1/3 da população brasileira é um crime de lesa-pátria.

        O programa, que este ano chegará a mais de 72% dos municípios do país, atende prefeituras de todos os partidos, inclusive 66% (452 cidades) das que são administradas pelo PSDB.

        Cuba conta com 6,9 médicos por 1.000 habitantes, um dos maiores índices do mundo. O Brasil, com 2/1.000; e os EUA, 3,2/1.000. Com a reaproximação EUA-Cuba, milhões de estadunidenses estão de olho no chamado “turismo médico”, ou seja, a possibilidade de se tratarem em Cuba, já que nos EUA o acesso ao sistema médico-hospitalar é caro e difícil para quem não dispõe de recursos.

        O convênio do Brasil com Cuba é monitorado pela OPAS (Organização Panamericana de Saúde), braço da OMS (Organização Mundial da Saúde) para as Américas. A OPAS tem 110 anos de serviços prestados. E longa tradição de seriedade e qualidade.

 

Frei Betto é escritor, autor de “Reinventar a vida” (Vozes), entre outros livros.

 http://www.freibetto.org/>    twitter:@freibetto.

Campesinas latinoamericanas abren surcos de un feminismo propio

Por Fabiana Frayssinet, de IPS noticias,

Un grupo de mujeres indígenas participan en uno de los debates de la V Asamblea Continental de Mujeres del Campo, en el marco de VI Congreso de la Coordinadora Latinoamericana de Organizaciones del Campo-Vía Campesina, celebrado en la localidad argentina de Ezeiza, en el Gran Buenos Aires. Crédito: Fabiana Frayssinet /IPS


EZEIZA, Argentina, 15 abr 2015 (IPS) – Organizaciones campesinas de América Latina intentan definir los conceptos de un feminismo  “campesino y popular”, que incorpore una cosmovisión rural, no siempre coincidente con la de las mujeres urbanas, o modelos económicos alternativos.

Para Gregoria Chávez, una veterana campesina de la noroccidental provincia argentina de Santiago del Estero, el feminismo incluye “las luchas y el apoyo de los compañeros para defender las tierras”.

Hasta hace poco, para ella el feminismo era un concepto extraño. Pero como otras tantas campesinas latinoamericanas en sus localidades, ahora protagoniza las batallas en su provincia contra  el avance del monocultivo de la soja y el desalojo de pequeños productores.

“A veces arrastramos esa concepción del feminismo como lo habíamos aprendido, de que para enfrentar al machismo hay que tener una actitud opresora también. Pero aquí no se trata de predicar eso, sino un feminismo con una actitud de solidaridad entre compañeras y compañeros”: Deolinda Carrizo.

“Yo pienso que la mujer es importante en el campo porque tiene más coraje que el varón. Yo no tengo miedo a nada. Siempre les digo a mis compañeras que sin coraje no vamos a conseguir nada”, relató a IPS.

Definir un feminismo propio no es tarea fácil para la Coordinadora Latinoamericana de Organizaciones del Campo-Vía Campesina, que celebra su  VI Congreso entre los días 10 y 17 de este mes, en el municipio argentino de Ezeiza, que forma parte del Gran Buenos Aires.

Pero sus integrantes tienen claro que no se limita a una “simple agenda de igualdad de género”.

La profundización del feminismo en el ámbito rural fue parte del debate de la V Asamblea Continental de Mujeres del Campo, un foro en el marco del Congreso que congregó a 400 delegadas de 18 países latinoamericanos y caribeños y se clausuró el martes 14.

Como ilustró Deolinda Carrizo, del argentino Movimiento Nacional Campesino Indígena, en la Asamblea al menos se intentó “abrir esos surcos cada vez más”.

El término de feminismo asusta  a muchas campesinas, según Rilma Román,  delegada de la Asociación Nacional Agricultores Pequeños de Cuba. Ella también integra la coordinación de la organización internacional Vía Campesina, donde la mitad de sus líderes son mujeres, según destacó.

“Asusta porque muchas veces se piensa que feminismo es que las mujeres estemos solas  luchando contra los hombres, que somos dos bandos”, explicó a IPS.  “Es un tema prácticamente nuevo en nuestros debates. Creo que hay que darse un tiempo para poder explicar y  llegar a un consenso”, opinó la delegada cubana.

Hay que explicar, por ejemplo, temas como el de la diversidad sexual. “Antes era muy difícil que en una comunidad campesina encontraras travestis que se manifestasen. Había mucha auto represión y represión que existe todavía”, relató Carrizo.

“A los más viejos les cuesta mucho entender que hay compañeros que tienen otra opción sexual. Poco a poco vamos viendo cómo abordar el tema y a animarlos a que lo acepten”,  agregó.

Campesinas latinoamericanas abren surcos de un feminismo propio

Tres generaciones de mujeres rurales recolectan vainas de algarroba en el pueblo de San Gerónimo, en la noroccidental provincia de Santiago del Estero, en Argentina. Las campesinas latinoamericanas producen la mitad de los alimentos de la región. Crédito: Fabiana Frayssinet/IPS

La V Asamblea de mujeres rurales reconoce la “contribución histórica” del feminismo, pero parte de un concepto diferente al del “capitalismo” que, interpretó Carrizo,  impuso la explotación, inclusive la de género.

Prefieren definirlo bajo la lupa de la reforma agraria, la disputa contra las corporaciones transnacionales agrícolas, la concentración de tierras y agua,  el agro negocio y la mega minería, que excluye y margina a hombres y mujeres.

La inequidad en cifras

Según la Organización de las Naciones Unidas para la Alimentación y la Agricultura (FAO), 58 millones de mujeres viven en zonas rurales de América Latina y representan una pieza clave de la seguridad alimentaria regional, de la preservación de la biodiversidad y de la producción de alimentos saludables.

Pero, pese a que producen la mitad de los alimentos de la región, las mujeres rurales viven en situación de desigualdad social, política y económica. De aquellas de más de 15 años, solo 40 por ciento cuentan con ingresos propios y ostentan apenas 30 por ciento con la titularidad de la tierra, 10 por ciento de los créditos y cinco por ciento de la asistencia técnica.

“Pero las mujeres, especialmente las del medio rural siempre fueron más excluidas”, contextualizó  Marina dos Santos, del brasileñoMovimiento de los Trabajadores Rurales Sin Tierra.

También lo están de las políticas públicas de salud o educación, destacó a IPS.

“En Brasil están cerrando escuelas rurales. Los puestos de salud, cuando los hay, no tienen médicos, enfermeras o medicinas. Muchas mujeres en el campo comienzan su trabajo de parto y por falta de hospitales o transporte terminan muriendo”, subrayó.

También se margina a las mujeres de la titularidad de la tierra o el acceso al crédito rural.

“La mujer es la que más trabaja pero es la última que tiene acceso a la tierra y la más explotada como mano de obra barata. El éxodo rural hizo que los hombres salgan cada vez más a trabajar fuera, y las mujeres se quedaron con la parte de subsistencia de sus familias”, ejemplificó Santos.

“Los terrenos se adjudican primero al hombre. Las mujeres que somos cabeza de familia, que no tenemos compañeros, no tenemos posibilidades porque debemos tener como referente a un hombre”,  agregó Luzdari Molina, de la Federación Sindical Agropecuaria de Colombia.

Otra particularidad, como sucede en Colombia, es que las mujeres del campo todavía están muy poco escolarizadas, porque tenemos que ocuparnos del hogar”, detalló a IPS

Las participantes en la V Asamblea destacaron como a las faenas domésticas y el cuidado de la familia, a las mujeres se les suma el peso de la producción de alimentos.

“En Santiago del Estero, hay épocas que tienen que ir al corral a atender los cabritos o vacas.  Cuando los hombres se van (como trabajadores temporeros a otras provincias), la mujer se queda sosteniendo el trabajo del hogar y de la tierra”, añadió Carrizo.

“Las campesinas no somos reconocidas como trabajadoras. En mi región (el departamento colombiano de Boyacá) desde las tres de la madrugada estamos levantadas para ordeñar vacas, cuidar la casa, preparar el desayuno para obreros, atender nuestra propia producción y el día se nos va”, planteó Molina.

Las mujeres rurales,  según la argentina Carrizo, son también las que han ejercido históricamente el rol de “guardianas de las semillas” y por ello viven como “violencia” los intentos de “privatización de las semillas”.

Igualmente sienten como violencia, aseguró la lideresa campesina argentina,  las fumigaciones con pesticidas, porque afectan “la salud de nuestros hijos y nuestra, porque causan abortos espontáneos, malformaciones, y  acumulación de estos venenos en la leche materna”.

Además, la brasileña Santos destacó que en aquellos problemas de género que son comunes con las mujeres urbanas, la situación se agrava para quienes viven en el campo. Citó como ejemplo el caso de la violencia doméstica, que empeora porque las comisarías especializadas de la mujer están en las ciudades.

En Colombia, añadió argumentos Molina,  “no hay nada que les garantice a las mujeres alejarse del territorio donde han sido agredidas”, lo que evita las denuncias.

“Los vecinos dicen no me meto, las cosas de pareja se arreglan debajo de las cobijas (mantas). Pero cuando se llega a los extremos, la comunidad va al entierro y hace misas para que le salven el alma del pobre marido. Es muy triste pero es real”, lamentó.

La cuestión es cómo abordar esos temas, a veces aceptados como naturales.

“En el campo  hay mucho machismo y muchas mujeres lo traen incorporado desde que nace”, observó la cubana Román.  “Hay compañeras o compañeros que creen que queremos que se separen las familias, o el divorcio”, agregó.

Por eso, planteó Carrizo, debería considerarse la “diferencia de cosmovisión de cada pueblo”.

“La mujer campesina en Colombia, por ejemplo, no se siente identificada como feminista. Lo que les choca (de la mujer urbana) es una cuestión de clase, que tienen ciertas comodidades y actividades diferentes a las suyas”, acotó Molina.

“A veces arrastramos esa concepción del feminismo como lo habíamos aprendido, de que para enfrentar al machismo hay que tener una actitud opresora también. Pero aquí no se trata de  predicar eso, sino un feminismo con una actitud de solidaridad entre compañeras y compañeros”, argumentó Carrizo.

Entrevista com dirigente do MST João Paulo Rodirgues sobre Eldorado dos Carajás – no Brasildefato 17

 http://www.brasildefato.com.br/node/31847

 “A reforma agrária não foi feita quase 20 anos depois do Massacre de Carajás”

 Em 17 de abril de 1996, 21 trabalhadores rurais eram mortos em Eldorado dos Carajás (PA). João Paulo Rodrigues, da coordenação nacional do MST, fala sobre os desafios atuais da luta pela reforma agrária. Neste Abril Vermelho, pelo menos 15 fazendas já foram ocupadas.


Por Bruno Pavan e Rafael Tatemoto

 

Do Brasil de Fato

 

O mês de abril tem sido marcado por intensas mobilizações no país este ano. A possibilidade de retirada de direitos históricos fez com que sindicalistas, partidos políticos de esquerda e organizações populares iniciassem um processo de lutas unitárias. Por conta dessas atividades, passou-se a utilizar a expressão Abril Vermelho.

 

Até esta terça-feira (17), pelo menos 15 fazendas foram ocupadas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no país. Com objetivo de chamar atenção para a pauta da reforma agrária, cinco fazendas foram ocupadas em Pernambuco, oito na Bahia e duas em São Paulo, nas regiões de Ribeirão Preto e Promissão. E o movimento promete novas ações durante todo o mês.

 

O termo Abril Vermelho foi herdado das mobilizações que o MST faz historicamente neste mês. Em 17 de abril de 1996, 21 militantes da organização foram mortos por agentes do Estado. O episódio ficou conhecido como Massacre de Eldorado dos Carajás. Como lembrança do episódio e da vida dos que morreram na luta, o movimento passou a intensificar suas atividades a cada abril.

 

O Brasil de Fato entrevistou com João Paulo Rodrigues, da Coordenação Nacional do MST, para lembrar o caso de Eldorado, falar sobre a situação da reforma agrária no país, bem como sobre atual momento político vivido pelo Brasil.

 

Brasil de Fato – Como o MST avalia as jornadas de luta neste mês? Quais resultados espera?

 

Há uma expectativa muito grande de que nós possamos, primeiro, fazer uma denúncia contra a paralisia da reforma agrária em todo o país e a ofensiva do agronegócio nas terras indígenas, nas áreas de preservação ambiental, como na Amazônia, e no uso demasiado de agrotóxicos. Além disso, o aumento da criminalidade, que ainda está muito relacionado ao latifúndio improdutivo, como foi no caso do massacre de Eldorado dos Carajás e que continua atacando os sem-terra. Queremos fazer esse diálogo de denúncia com a sociedade.

O segundo grande objetivo é aproveitar esta semana e a próxima para cobrar o governo o assentamento imediato de todas as famílias que estão acampadas, que hoje são 130 mil. Reivindicamos do governo outros dois grandes temas: a construção de um PAC [Programa de Aceleração do Crescimento] para a reforma agrária, para resolver os problemas de infraestrutura, estradas, energia elétrica, garantir abastecimento de água e saúde nos assentamentos e uma segunda questão é a melhoria da política de crédito, que possa valorizar a produção de alimentos saudáveis da agroecologia, crédito que seja voltado para a juventude e para as mulheres, bem como uma política de agroindústria.

 

Por fim, achamos que é um momento oportuno para dialogar com a sociedade brasileira sobre uma nova política agrária, que produza alimentos, mas que também possa garantir que a juventude fique no campo, democratizando terras e criando uma melhoria nas condições de vida da população.

 

BdF – Você citou Carajás. O massacre completa 19 anos esta semana. O que mudou de 1996 até hoje?

 

O massacre foi uma tragédia para os camponeses brasileiros. Foi uma decisão do Estado brasileiro massacrar aqueles trabalhadores rurais. Com a repercussão do fato, nós conseguimos várias conquistas: pautar a reforma agrária na sociedade, apontar para o fato de que na Amazônia existe um problema concreto de luta pela terra e denunciar a violência no campo. O ponto negativo foi que a reforma agrária não foi feita quase 20 anos depois daquele massacre. Isso nos preocupa. Ainda tem fazendas improdutivas com jagunços com acampamentos próximos, militantes do MST sendo perseguidos, são temas que nesta semana nós queremos refletir e discutir com a sociedade.

 

BdF – O MST se somou às manifestações contra o Projeto de Lei 4330, que libera as terceirizações. Como esse projeto pode afetar os trabalhadores do campo?

 

Hoje, entre os trabalhadores como um todo, quem é mais prejudicado e tem as piores condições de serviço são justamente os trabalhadores rurais. Nós temos o exemplo da cana-de-açúcar, um trabalho com condições análogas à escravidão. Nós temos também os trabalhadores que lidam com agrotóxicos e são envenenados diariamente. O campo tem quase 3 milhões de assalariados, mas apenas 1,2 milhão têm carteira assinada. Já são precarizados por natureza. Com essa proposta, há a chance de perdemos ainda mais. Além de serem os trabalhadores com as piores condições de vida, [isso] passaria a ser legal, até esse momento nós ainda podemos denunciar como trabalho precário ou escravo.

 

Diante disso, nós, trabalhadores do campo, dos movimentos sociais, do movimento sindical, estamos muito preocupados com a possibilidade de aprovação desse projeto de lei, que não trará dignidade para um setor tão importante para a geração de riquezas no país, que são os trabalhadores rurais.

 

BdF – A conjuntura política brasileira é delicada, com um Congresso em que percebe avanço no conservadorismo. Em que espaço o MST pensa que se deva dar a luta hoje?

 

Nós não estamos assustados com a conjuntura. Nós já vivemos momentos parecidos como esse. Estamos na luta há 30 anos, sabemos o que são esses períodos de crise. Achamos que essas decisões que o Congresso está tomando gerarão contradições, serão brigas longas.

 

O Projeto de Lei da Terceirização ainda tem que passar pelo Senado, que já indicou que não irá aprovar da forma como está. Acreditamos muito na possibilidade de um veto total ou parcial da presidenta Dilma [Rousseff], o que já dificulta a aprovação.

Tem outros projetos que temos a mesma preocupação. O caso da maioridade penal, que é um grande problema para a juventude, somos contra e vamos à guerra contra. A possibilidade de ajustes no Estatuto do Desarmamento, liberando o uso de armas. Há vários temas que não passarão de graça pelo Congresso. Para o Movimento, vai servir para politizar novamente a população e para fazermos o debate de qual modelo de país e democracia nós queremos para os próximos anos. A parte boa de tudo isso é que abre uma nova agenda de lutas, que não é composta só de reivindicações econômicas, mas direitos sociais como um todo. A pauta dos direitos, que estará em jogo no próximo período, é importantíssima para politizar a juventude.

 

BdF – Como o movimento vê as nomeações do governo Dilma, com, de um lado, Kátia Abreu na Agricultura e, de outro, Patrus Ananias no Desenvolvimento Agrário e Mária Lúcia Falcón no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra)?

 

O MST está preocupado com a situação. Estamos chegando a 100 dias do segundo mandato, e até agora só tivemos boas conversas, não houve nenhuma decisão oficial do governo de quantas famílias serão assentadas, qual será o volume de crédito agrícola. O MST não compactua com o que o governo tem feito até agora.

 

É importante o governo escolher bem a equipe ministerial, mas é responsabilidade da presidenta Dilma. Não queremos assumir que o problema é “porque o ministro é ruim ou o presidente do Incra é bom”. Achamos que é um problema de rumos de governo. Pode colocar qualquer um para conversar com a gente, desde que existam mecanismos e dinheiro para fazer política agrícola. Ainda assim, foi um desserviço para a esquerda brasileira e os setores progressistas a presidenta Dilma ter feito uma aliança com os setores mais conservadores na política, a Kátia Abreu na Agricultura e o Joaquim Levy conduzindo a política econômica.

 

Os resultados das eleições de outubro foram fruto dos setores progressistas. Essa aliança não se justifica nem pela correlação de forças, nem pelo cenário econômico. A presidenta erra, criando muitos problemas com a base que ajudou na sua reeleição. O MST vai continuar fazendo luta e denunciado os atos dessas pessoas que estão infiltradas em um governo que foi vitorioso com outra bandeira.

 

A escolha do Patrus e da Falcón foi importante, mas se eles não tiverem recursos e infraestrutura disponíveis para fazer a reforma agrária, eles serão desgastados. O MST não apoiará só porque são bons companheiros. O MST apoiará política, e não pessoas. A presidenta Dilma tem que dizer a que veio seu segundo mandato em relação à reforma agrária.

 

BdF – Foi anunciado o lançamento de um Plano Nacional de Reforma Agrária. Qual a posição do movimento?

 

Construir planos é bom, mas nós temos um problema real que já tem dez anos: são 130 mil famílias acampadas. Toda e qualquer conversa no próximo período passa pela resolução dessa questão emergencial. A reforma agrária é uma feijoada, precisa de tempero, um conjunto de ingredientes, mas se não houver o feijão, que é a terra, não passa de uma boa ideia. Se não resolver o problema das famílias acampadas, dificilmente os demais pontos irão resolver a demanda exigida pelo movimento. A condição para haver um diálogo bom e para que a gente possa avançar é um programa massivo de assentamento para as famílias acampadas.