Canto do lutador Pelos 25 anos do MST

Augusto Juncal

Pode ser que amanhã,  antes mesmo da aurora, depois de toda luta e cansaço, como uma casa sem suas portas, eu desperte mais pobre que uma trouxa.

Pode ser que amanhã, antes mesmo dos pássaros, depois de todo canto e coragem, como uma nuvem solitária, por vento levada, sem pressa, sem direção, eu desperte mais triste que uma gaiola.

Pode ser que amanhã, antes mesmo da enxada, depois de todo sangue derramado, como rio no mar pra sempre perdido, eu desperte mais líquido que a chuva.

Pode ser que amanhã, minha vista larga não alcance as estrelas, cego que me encontre de tanto luto.

Pode ser que amanhã, minha liberdade de fogo não alumie trincheiras, e seja apenas pedra esculpida.

Pode ser que amanhã tudo isso aconteça. E cego meu facão, tombarei por cima de todos meus irmãos.

Mas antes que esse amanhã se faça, de pé, apoiado no cabo da minha enxada, com um olho a dormir e outro a espreitar, as rugas dos meu pés cheios de caminhos se avolumarão em raízes rasgando fundo a terra.

Antes e antes que esse amanhã se faça serei árvore, serei seiva, serei fruto. Serei promessa, serei dádiva, serei absoluto

Serei tronco, madeira, cabo de foice.

Serei formiga, serei uma, serei duas, serei correição.

Serei porta, serei cancela, serei pra sempre revolução.